SOMBRAS
DE UM BUFÃO
Sombras me perseguem,
Enquanto fujo de mim,
Escorrendo por almas,
Sujos trapos sem fim...
Triste, eu morro,
Afogado em pranto,
Consumido pela vida,
Descarnada mentira...
Chego a lugar nenhum,
Vindo só e desnudo,
Um palhaço decaído,
Hóspede da desilusão...
PRANTO CALADO
Poderia dizer que te amo,
Chorar a timidez da tua alma,
Despir-te dessa solidão inócua,
Hermética e passional,
A consumir meus olhos,
Agora perdidos na fogueira,
Da tua etérea eternidade.
Perdoe por mim, por ti,
Essa rascante culpa crescente,
De uma luxúria adolescente,
Tão fogosamente doente,
A espera de um cego afago,
Dos teus tristes lábios rubros,
Envergonhados e carentes.
Engano-me com a dor,
Aqueço-me na tristeza,
Brinco com as lágrimas,
Que vertem desse servo,
Humilde palhaço solitário,
Jocoso a entreter teu sorriso,
Calado no pranto de querer-te.
PULSÃO
Não posso fugir, me calo,
Sem controle, me mato,
Rumo ao desespero, aos cacos,
Incerto e funesto caos,
A desaguar em falsidade.
Pulsão coesa a quebrar,
As portas desse vão,
Por mim há muito velado,
Cruel realidade dos atos,
Cometidos a margem dos fatos.
A escuridão se faz então,
Nobre Dona sem coração,
A puxar-me infiel e inquieta,
Até sua morada deserta,
Nas profundezas da solidão.
JAZMIM
Plantei uma flor em meu jardim.
Nobre jasmim, entre espinhos e capim.
Solitário, amarelou e murchou.
Reguei, podei, rezei.
Enfim, um dia, escureceu,
O sol se pôs em meu jardim.
A luz, não mais voltou,
E o jasmim, caído, derrotado
ficou.
Perdido na grama, ele brochou.
Deitado ao léu, foram-se
as pétalas.
Assim como a lágrima,
Que em mim brotou.
NADA ALÉM
Vi tudo que não sei,
Sem querer, sem viver,
Não pertenço a meu
lado,
Sou desgraça, insensato.
Morri antes de mim,
Em gritos inúteis,
Teso nas dores rentes,
Desnudo de ilusão.
Não tenho mais nada,
Nunca tive até então,
Não irei ter ou receber,
Nada além de solidão.
JOELHOS
Ajoelhado em lágrimas,
Vi o mundo partir-se,
A fé esvair-se,
Em áridos cacos d alma.
Carrego o peso,
De viver acorrentado,
Ao amor mais vil,
A dor mais sutil.
Arrastado, vou-me,
Alargando as fendas,
Sangrando os sonhos,
Matando as paixões.
Largo o corpo ao eterno,
Áspero, úmido e gelado,
Espelho de uma vida morrida,
Nas margens da solidão.
ABORTO
Acorde, pequeno aborto,
Puro e melancólico,
Ser transtornado,
Pus da humanidade.
Sei da cor a dor,
Senti seu beijo de fel,
Naveguei suas almas,
Perdidas na palidez do caos.
Realidades partidas,
Vidas parasitárias,
Excrementos d alma,
De um patético perdedor.
SÓ
Vida, só é como estou,
Meu pranto,
mundo,
canto,
Fado,
Amor,
Medo,
Desejo,
Calor,
Tudo...
Vida, só eu sou.