Na íntegra, esta história só é contada por Ovídio, que não deu ao tema tratamento notável. O versos da parte final são extraídos do poeta alexandrino Mosco.
Na
Ortígia, uma das ilhas de Siracusa, a maior cidade da Silícia,
existe uma fonte sagrada chamada Aretusa. Num passado remoto,
porém, Aretusa não era água e nem mesmo ninfa das águas, mas
apenas uma bela e jovem caçadora e seguidora de Ártemis. A
exemplo desta, não queria saber dos homens e só gostava da
caça e da liberdade das florestas.
Um dia, cansada e
acalorada pelo esforço da caça, Aretusa chegou a um rio de
águas cristalinas sobre cujas águas os chorões prateados
lançavam uma sombra de grande frescor. Não havia lugar mais
delicioso para um banho. Aretusa despiu-se e mergulhou nas águas
frescas e serenas. Durante algum tempo, nadou tranqüilamente de
um lado para o outro, na mais perfeita paz; depois, teve a
impressão de que alguma coisa se agitava logo abaixo dela, e,
assustada, saltou para a margem. Ouviu então uma voz que lhe
dizia: "Por que tanta pressa, ó bela jovem?" Sem olhar
para trás, afastou-se do rio e embrenhou na floresta, correndo a
uma velocidade que o medo multiplicava muitas vezes. Em seu
encalço ia uma criatura muito mais forte do que ela, quando não
muito mais rápido também. O desconhecido pediu-lhe que parasse,
pois era Alfeu, o deus do rio, e só a estava perseguindo porque
a amava. Aretusa, porém, não queria saber dele, e só pensava
em fugir. Foi uma longa corrida, mas nunca se colocou em dúvida
quem seria o vencedor, já que ele era capaz de correr por muito
mais tempo do que ela. Quando já estava sem forças de tanto
correr, Aretusa invocou a sua deusa, e não o fez em vão:
Ártemis transformou-a em uma fonte, e, fendendo a terra, fez com
que se formasse um túnel que, sob o mar, unia a Grécia e a
Silícia. Aretusa mergulhou e foi emergir na Ortígia, onde o
local em que sua fonte gorgoleja é chão sagrado e consagrado
por Ártemis.
Conta-se, porém, que
nem assim Aretusa conseguiu ver-se livre de Alfeu. De acordo com
os relatos, o deus assumiu novamente a forma de um rio e seguiu-a
pelo túnel, fazendo com que suas águas se fundissem com as dela
na fonte. Conta-se também que, muitas vezes, flores gregas
brotam de seu fundo, e que basta jogar uma taça de madeira no
rio Alfeu, na Grécia, para que a mesma vá aparecer na fonte de
Aretusa na Silícia.
Com
suas águas, Alfeu abre caminho nas profundezas do
[abismo,
Indo em busca de Aretusa com belas folhas e flores,
[presentes nupciais.
Estranhos são os caminhos do Amor, esse menino travesso
[e perturbador
Que, com seus encantamentos, ensinou um rio a mergulhar.