16. PREPARAÇÃO PROFISSIONAL

O interesse votado às escolas de Angola, no final do século passado e princípios do decorrente, não teve orientação e intensidade constantes, havendo a destacar períodos de grande dedicação seguidos por outros de notório desinteresse. Além disso, pode registar-se ainda um factor permanente, que muito influiu nas medidas adoptadas e que consistiu em considerar-se a África como dependência económica da Europa, sujeitando-a através da quase totalidade das iniciativas governamentais ou administrativas às conveniências precípuas e aos interesses primaciais dos países dominadores. Portugal, que antes adoptara uma política sua, eficiente ou deficiente, correcta ou não, vestia agora com desplante, com subserviência incompreensível, o figurino estranho. Tal facto influiu poderosamente na marcha da evolução escolar e determinou a adopção de medidas pouco sensatas, provocou o abandono das directrizes mais convenientes, motivou experiências pouco profícuas e, naturalmente, ocasionou uma paragem na difusão da cultura, subordinando a própria actividade escolar a interesses imediatos e a valores concretos, com o correspondente atraso da marcha da evolução social.

Costuma dizer-se frequentemente que Angola só teve ensino secundário a partir de 1919, data da fundação do Liceu Salvador Correia. Embora no fundo a afirmação seja verdadeira, não é completamente exacta. Não devemos esquecer que se fizeram aqui diversas tentativas para dotar a província com o ensino secundário, chegando a ensaiar-se até um ensino que se aproximava do universitário. Fizemos referência a essas iniciativas no devido lugar deste trabalho.

Entre todas as escolas de ensino secundário de Angola, tanto oficiais como particulares, devemos salientar uma, a Escola Principal de Luanda. Distinguiu-se entre todas elas pela duração que teve e o simples enunciado dos seus programas mostra que não pode considerar-se dentro do que hoje chamamos ensino primário, mesmo o complementar, pois o ultrapassava em diversos pontos. Não devemos deixar de referir, no entanto, que os frutos da sua actividade não corresponderam ao que seria lógico esperar. A finalidade da Escola Principal era preparar indivíduos que pudessem tomar sobre si o encargo docente, pelo que poderá considerar-se um estabelecimento de preparação profissional. Foi sob este aspecto que falhou totalmente.

Na Escola Principal de Luanda eram leccionadas algumas disciplinas que hoje fazem parte do ensino secundário. Não acontecia assim na primeira fase da sua história, antes da reforma promovida pelo decreto de 30 de Novembro de 1869; até esta altura, funcionava como escola complementar do ensino primário. A partir daqui, foram introduzidas matérias mais adiantadas, o esquema dos programas era frequentemente alterado, e o resultado de tudo isso foi o seu descrédito e ineficiência prática.

A Escola Principal abrangia três cadeiras, precisando de outros tantos professores. O primeiro esboço conhecido, após a reforma mencionada, era assim:

—1ª Cadeira— Língua Portuguesa;
—2ª Cadeira— História e Geografia (Pátria e Geral);
—3ª Cadeira— Língua Francesa.

Este escorço didáctico foi diversas vezes alterado. Poderemos até admitir que os professores tivessem a liberdade de o tornar elástico, mais ou menos completo e complexo. Segundo um aviso publicado em 5 de Outubro de 1880, o esquema era já bem diferente, assim:

—1ª Cadeira— Português, Francês e Inglês;
—2ª Cadeira— História e Geografia (Pátria e Geral);
—3ª Cadeira— Desenho e Economia (Política e Agrícola).

A primeira cadeira era regida pelo P. António Castanheira Nunes; a segunda cadeira estava confiada a Joaquim Eugénio de Sales Ferreira; e a terceira cadeira ficara a cargo de Francisco Maria Quintela de Assis.

Segundo o aviso de 23 de Outubro de 1886, a estrutura docente tinha sofrido alterações, deste modo:

—1ª Cadeira— Gramática, História e Geografia;
—2ª Cadeira— Francês, Inglês, Ciências e Economia;
—3ª Cadeira— Matemática, Desenho e Agricultura.

No ano lectivo de 1889-1890 voltava-se à forma primitiva:— Língua Portuguesa; História e Geografia; Língua Francesa.

No dia 21 de Dezembro de 1883, o governador-geral Francisco Joaquim Ferreira do Amaral presidiu à cerimónia da distribuição de prémios a quarenta e nove alunos que se haviam distinguido pelos resultados obtidos. Não há indicação dos prémios oferecidos.

Entre os professores deste estabelecimento de ensino podemos apontar, nos seus primeiros tempos, José Maria da Lembrança de Miranda Henriques; e, no período que estamos considerando, recordaremos os nomes do P. António Castanheira Nunes e Joaquim Eugénio de Sales Ferreira. Mas não devemos esquecer que estamos em período de franca decadência, sem sabermos se os professores não teriam nisso bastante culpa!

Em Fevereiro de 1889, após o falecimento do professor Miranda Henriques, ocorrido em Lisboa alguns meses antes, foi lançada a ideia da construção de um monumento em sua memória. O tesoureiro da subscrição pública era Luís da Câmara Leme, funcionário da Câmara Municipal. Não temos conhecimento de que chegasse a ser erigido.

O P. Castanheira foi pároco e organista, missionário, professor régio, municipal e particular, chegou a ser castigado, exerceu função de inspector, veio para Angola em 1860 e foi aposentado em 1903.

No dia 7 de Outubro de 1883, foi relevado ao P. Castanheira Nunes o facto de ter dado aulas em Setembro, mês de férias, esperando que lhe fosse permitido ter férias em Janeiro. O governador-geral autorizou, por esta vez, a dar férias aos alunos em Janeiro, embora não tivesse competência para alterar o ano escolar. Admitia-se que a proximidade dos festejos carnavalescos afastava os alunos da escola...

O mesmo sacerdote foi nomeado, em 7 de Janeiro de 1884, para exercer as funções de curador dos presos pobres. O lugar estava vago devido ao falecimento de Manuel Inácio dos Santos Torres; ocupou-o só até 28 de Junho seguinte.

Pouco depois, em 5 de Julho, era autorizado a ensinar em dois períodos distintos, de manhã na classe mantida pela Câmara Municipal e à tarde na Escola Principal. Salientava-se que era o único professor e que tinha de atender as exigências de duas classes. A Escola Principal funcionava no antigo edifício do hospital, junto à respectiva igreja. Tinha sido inaugurado pouco antes o Hospital D. Maria Pia, pelo que as antigas instalações ficaram vagas. Esta é uma das poucas, talvez única referência ao local de funcionamento das aulas.

Nos últimos dez anos do século XIX notou-se em Angola uma espécie de retrocesso escolar. O ensino era pouco apreciado pela população daquele tempo; verifica-se isso com facilidade se atendermos ao que ocorreu com a Escola Principal de Luanda, então o seu mais importante estabelecimento de ensino, com uma tradição de quase meio século de existência. Aconteceu coisa semelhante com o ensino elementar. E, por mais que se procurem, não se detectam as causas com clareza. Temos a referir apenas o ligeiro impulso que lhe foi dado através das escolas municipais.

Em 24 de Março de 1894, o bacharel Adelino Barbosa de Lemos foi nomeado professor da Escola Principal, para substituir António Urbano Monteiro de Castro, recentemente falecido. Em 1 de Março de 1895, foi nomeado outro professor, o bacharel Manuel do Sacramento Monteiro, encarregado de ensinar a Língua Francesa. Foram ambos exonerados pela portaria de 3 de Outubro de 1896, na qual se afirmava que não havia nessa altura alunos que frequentassem o estabelecimento e por isso tinham cessado os motivos que haviam levado à nomeação dos dois agentes do ensino. Desempenhava então as funções governativas, com a pomposa designação de comissário régio, o conhecido oficial da armada Guilherme Augusto de Brito Capelo.

A Escola Principal, que tivera relativo prestígio e exercera alguma influência, embora menor do que seria lógico esperar, estava a perder importância. Poderá ser considerada a hipótese de falta de interesse por parte das populações, por parte dos alunos, dos professores e das autoridades. Talvez a responsabilidade possa distribuir-se por todos. Devemos ter em consideração que o objectivo em vista, a preparação de pessoal que pudesse ser encarregado do magistério, não exercesse qualquer sedução, pois o ensino das primeiras letras foi sempre actividade com poucos atractivos!

Entre os factores e causas que podem apontar-se para explicar o fracasso, devemos salientar as seguintes:

—As escolas elementares davam poucos alunos preparados para prosseguirem os estudos;
—Os poucos que continuavam a estudar em breve desistiam;
—Os professores dedicavam-se muito pouco aos alunos e à escola, chegando a não saber onde funcionava;
—Os conhecimentos adquiridos não estavam adaptados às necessidades e interesses correntes;
—As autoridades descuravam este problema, pois nomeavam professores sem haver alunos.

Este último ponto foi exemplificado atrás, mas há outros exemplos a registar. Quando em 4 de Outubro de 1888 o P. António Castanheira Nunes obteve a nomeação definitiva, a escola também não funcionava por não ter a quem ensinar... E determinada inquirição oficial, junto de pelo menos um professor, demonstrou que não sabia onde deveria exercer as suas funções!...

O interesse dos luandenses pela divulgação do saber não era grande. Temos indicações seguras de que as famílias mais abastadas preferiam mandar os filhos para Portugal, quase sempre para Lisboa, desde muito novos. E isso tanto para os rapazes como para as meninas. Juntavam as vantagens de melhor clima às que provinham de melhor ambiente cultural e social. Não devemos deixar de ter em conta que, nesse tempo, se reuniram em Luanda figuras destacadas quanto ao seu valor intelectual e preparação literária, por vezes superior ao que a sua escolaridade poderia justificar. Algumas exerceram papel influente junto dos seus contemporâneos e conterrâneos, distinguindo-se pelo interesse que os problemas do espírito e da cultura lhes mereceram. São exemplos eloquentes os de Pedro Félix Machado e Joaquim Dias Cordeiro da Mata, entre os que nasceram e se prepararam em Angola.

A Escola Principal de Luanda, que havia sido criada pelo decreto de 14 de Agosto de 1845, veio a ser extinta pelo diploma de 21 de Junho de 1906. Nele se lê, expressamente: — "A Escola Principal não tem dado os resultados que se esperavam por falta de frequência de alunos".

* * *

Vimos já que, nos anos de 1878, 1879 e 1880, foram efectuadas obras de adaptação do antigo convento e igreja dos jesuítas; o templo tivera várias aplicações e servira até de cavalariça; pretendia-se, agora, instalar aqui uma Escola Profissional. Os gastos efectuados atingiram as quantias de 3.250$000, 21.800$000 e 3.400$000, respectivamente e em números redondos. Estas informações constam dos relatórios da Direcção das Obras Públicas de Angola. Quando o capitão de engenharia João António Ferreira Maia assumiu as funções de director deste departamento oficial, declarava-se publicamente que as referidas obras estavam paradas desde 18 de Novembro de 1880. A data da posse mencionada foi a 8 de Março de 1881. Aproveitamos a oportunidade para referir que aquele funcionário dedicava grande interesse à instrução, o que foi salientado nas notas biográficas inseridas no livro Primeiras Letras em Angola.

A Escola Profissional de Artes e Ofícios de Angola foi criada por portaria datada no dia 21 de Abril de 1886, sendo na mesma altura publicado o respectivo regulamento. Outra informação, porém, diz-nos que a sua criação legal era mais antiga, pois vinha já de 1 de Dezembro de 1883, o que pode aceitar-se sem dificuldade se pensarmos que pouco antes tinham sido feitas obras de adaptação no edifício correspondente. Pretendia-se dar aos alunos instrução profissional eficiente, montando oficinas próprias, a cargo do Estado, sem deixar de ter em conta a instrução literária conveniente, preparando os estudantes o mais perfeitamente possível, sob os aspectos moral e social. Tinha em vista enfrentar a sério o problema da educação e ocupação dos jovens que vagabundeavam pela cidade, procurando fazer deles elementos válidos da sociedade em que deveriam integrar-se. A sua projecção deverá ter sido quase nula!

No dia 18 de Janeiro de 1906, foi criada em Luanda a Escola Profissional D. Carlos I. Na mesma data, foram criados os seguintes estabelecimentos de ensino, relacionados com o ultramar: — Escola Colonial de Lisboa; Escola Elementar de Navegação e Escola Elementar de Operários da Construção Civil, na cidade da Praia, Escola Elementar de Operários Serralheiros, de S. Vicente, em Cabo Verde; Escola de Artes e Ofícios de S. Tomé, na cidade e ilha deste nome.

Para que a Escola Profissional D. Carlos I, de Luanda, pudesse entrar em funcionamento, foi votada em 29 de Agosto desse ano a verba de catorze contos.

O respectivo programa de estudo consistia em:

Ensino teórico:

—Português; Geografia; História; Aritmética; Geometria; Sistema Métrico (obrigatório em Angola desde 18 de Setembro de 1905); Desenho; Contabilidade Comercial; Noções de Agricultura; e Doutrina Cristã;

Ensino prático:

—Todos os ofícios que se exercessem nas oficinas do Estado, a que a Escola ficaria anexada; Desenho aplicado a esses ofícios; Ginástica; Natação; Remo; Conhecimentos gerais da profissão de marinheiro; Aprendizagem dos ofícios de sapateiro, carpinteiro e funileiro; Exercícios da Escola de soldado e pelotão.

Antes de prosseguirmos, recordemos que no dia 14 de Maio de 1891 foi criada em Angola, para funcionar num barco que poderia fazer pequenas viagens mas que em regra estaria fundeado no porto de Luanda, uma escola de habilitação de marinheiros e artífices navais auxiliares, de origem africana, para poderem vir a prestar serviço na marinha colonial. Deveria ministrar instrução a um grupo compreendido entre cinquenta e cem candidatos por ano. Em igual data foi aprovado o regulamento por que deveria orientar-se o seu funcionamento e actividade. Os frutos produzidos deverão ter sido insignificantes.

Estava previsto que a Escola Profissional D. Carlos I viesse a ter diversas oficinas, como por exemplo as de trabalhos de ferro, latão e bronze, assim como a de aparelhagem de telegrafia. Para o funcionamento do estabelecimento de ensino e serviços anexos, a despesa anual era calculada em quinze contos. O governador-geral de Angola, em face dos resultados que viesse a ter, podia estabelecer filiais desta escola em Benguela, Moçâmedes e outros pontos da província que fossem julgados convenientes e quando se reconhecesse a sua oportunidade. Os alunos seriam, geralmente, indígenas africanos recrutados no interior do território, por indicação das autoridades gentílicas. Poderiam admitir-se também os órfãos e desvalidos, sob proposta dos administradores dos concelhos. No primeiro ano do seu funcionamento o número de alunos não poderia exceder cinquenta.

A Escola Profissional D. Carlos I, de Luanda, foi inaugurada pelo príncipe real D. Luís Filipe, no dia 19 de Julho de 1907, por ocasião da sua histórica visita a Angola e Moçambique. Inaugurou na mesma altura a Escola de Intérpretes Eduardo Costa (Curso de Língua Quimbundo), o Seminário-Liceu (transferido da Huíla para Luanda), e o Museu de Arte Gentílica e Objectos Etnográficos, que lhe ficava anexo.

O Regulamento da Escola Profissional D. Carlos I foi aprovado em 26 de Fevereiro de 1907. Estabelecia o seguinte plano de trabalho:

1ª Secção:

—Serralheiro mecânico; Serralheiro civil; Torneiro mecânico; Fundidor de ferro; Fundidor de metais; Ferreiro; Funileiro (também designado caldeireiro ou latoeiro); e Malhador (ajudante de ferreiro);

2ª Secção:

—Carpinteiro (de diversas especialidades); Marceneiro; Entalhador; Alfaiate; e Sapateiro.

Pouco depois da proclamação da República Portuguesa, a Escola Profissional D. Carlos I passou a ser designada por Escola Profissional de Luanda, pois houve a preocupação mesquinha de abolir os nomes dos membros da família real em todas as designações. Veio a ser extinta logo por diploma de 1 de Junho de 1911, embora se não considerasse então esta medida como definitiva, mas apenas como suspensão temporária do seu funcionamento. Dizia-se que não conseguira atingir os fins que a sua criação teve em vista, devido a ser péssimo o sistema de recrutamento dos seus alunos, que quase sempre ingressavam nela com preparação defeituosa, sem a cultura de base suficiente para prosseguirem com êxito os seus estudos e a preparação profissional. Este arrazoado assemelha-se muito a um sofisma, pois os educandos não iam continuar mas sim iniciar a escolarização. Não havia na escola a disciplina conveniente, pelo que o aproveitamento escolar era inconcebivelmente baixo.

* * *

Em 24 de Março de 1910, José da Silva Miguéis foi nomeado para exercer interinamente o cargo de chefe da oficina dos telégrafos, que estava anexa à Escola Profissional D. Carlos I. Acumularia estas funções com as de director do estabelecimento de ensino, que estava já a desempenhar desde o dia 5 de Agosto do ano anterior.

No dia 15 de Março daquele ano de 1910, tinha sido nomeada uma comissão composta pelo secretário-geral de Angola, director dos Telégrafos e director da Escola Profissional, à qual foi conferido o encargo de elaborar o regulamento do Curso Prático de Telegrafia, que nela iria funcionar. Este curso, todavia, só foi criado em 13 de Abril. Funcionaria de 1 de Maio a 31 de Outubro e teria seis aulas semanais em cada disciplina. Nos meses em que não havia aulas, os alunos fariam trabalho prático na estação telegráfica e nas oficinas da escola. Teria a duração de três anos, com o seguinte esquema de estudo:

1º Ano — Língua Portuguesa; Língua Francesa; Rudimentos de Aritmética; Desenho Linear;
2º Ano — Língua Portuguesa; Língua Francesa; Noções Elementares de Geografia; Rudimentos de Físico-Química;
3º Ano — Elementos de Electrotecnia; Telegrafia Eléctrica; Legislação dos Telégrafos; Serviço Prático.

Quer-nos parecer que esta última rubrica devia ter equivalência ao que hoje se chama estágio, em que os alunos finalistas poderiam tomar contacto directo com o serviço e preparar-se para, por si mesmos, poderem tomar a responsabilidade profissional.

A portaria provincial de 9 de Setembro de 1913 criou em Luanda um novo estabelecimento de ensino, uma escola para a habilitação profissional do pessoal dos Correios e Telégrafos. O curso duraria dois anos e cada um dos títulos teria três aulas semanais, sendo ministrado o ensino das seguintes disciplinas:

1º Ano —Francês; Inglês; Mecânica; Matemática; Físico-Química;
2º Ano —Francês; Inglês; Geografia; Telegrafia Eléctrica; Legislação.

Na mesma data da sua fundação, foi aprovado o Regulamento da Escola dos Correios e Telégrafos de Angola, pelo qual ficámos sabendo exactamente a sua designação oficial. Veio a ser inaugurada no dia 6 de Outubro do mesmo ano, em cerimónia integrada nas comemorações do aniversário da proclamação da República Portuguesa. Falava-se nessa altura num projecto de organização da instrução pública, em Angola, dizendo-se que os respectivos planos tinham sido apresentados ao ministro.

Não deixaremos de dizer que, pelo decreto de 11 de Dezembro de 1902, o governador-geral de Angola era autorizado a criar neste território escolas práticas de serviços postais, onde se ensinasse: Francês; Inglês; Matemática; Geografia Geral; Geografia Comercial; Geografia Postal; Mecânica; Físico-Química; Telegrafia Eléctrica; Legislação Nacional e Internacional dos Correios.

No dia 22 de Outubro de 1915, ficou estabelecido que se gastasse no pagamento de vencimentos a seis professores, na concessão de subsídios a sete alunos, na aquisição de móveis e em material escolar a importância de 2.222$00, autorizada pelo ministro a ser aplicada em benefício da Escola de Correios e Telégrafos. E um ano mais tarde, em 24 de Novembro de 1916, o Governo central determinou que passasse a funcionar sob a direcção e orientação pedagógica do director dos Telégrafos, com quatro professores, sendo três deles funcionários públicos e o outro contratado para ministrar o ensino das línguas estrangeiras. Apesar de não ser expressamente nomeado, este deveria ser o súbdito britânico Cyril Jakson Rogers. Os quinze alunos que a frequentavam tinham o subsídio global de 1.642$50.

Em 6 de Dezembro de 1917, era publicado um aviso pelo qual se afirmava que, nesse ano lectivo, a Escola de Correios e Telégrafos funcionaria somente com o primeiro ano, abrindo o curso em 10 de Dezembro. No mês de Agosto de 1918 fizeram exame três alunos — Inocêncio Van-Dunem, Manuel Bento Ribeiro e João Bento Ribeiro — que se matricularam para a anuidade seguinte no segundo ano. com mais doze alunos do primeiro ano, a principiar o curso. Perfaziam-se assim quinze alunos; a lotação da escola comportava vinte e cinco estudantes

No acto da posse do governador-geral Custódio Miguel Borja, em 17 de Março de 1904, o presidente da Câmara Municipal de Luanda, Julião Monteiro Torres, afirmou em dado momento do seu discurso:

"Sobre a instrução, pode dizer-se que temos retrogradado. Construiu-se há muitos anos um edifício para a Escola de Artes e Ofícios, mas tal estabelecimento não chegou a ser inaugurado, até que há tempos foi afinal aproveitado, parte para a instalação da Imprensa Nacional e outra parte para os casões militares. Não há ainda um liceu, que tanto se tem pedido. Não há escolas, pode dizer-se, senão as mais rudimentares, sustentadas pelo Município — das outras parece que só pelo Orçamento da Província se percebe a sua existência — e sem instrução dos povos não há progresso possível".

Em resposta, o governador-geral afirmou:

"Grande atenção deve merecer a instrução. Muito se faz já, é certo, com a escola primária e a catequese, mas isso não basta. Os filhos de Angola, como os dos europeus que aqui se fixam e residem, carecem de prosseguir nos seus estudos secundários, com garantias que lhes não dá a obsoleta Escola Principal, ainda hoje instituída em harmonia com a lei de 30 de Novembro de 1869. Luanda precisa de ter, tem incontestável direito a ter, como Goa e Macau, um liceu nacional. E ele, orador, que durante a sua administração em Macau tanto concorreu para que essa bela cidade do Extremo Oriente fosse dotada com tão necessária garantia da instrução, não hesitará agora em envidar, para tal conseguir (para Luanda), o melhor dos seus esforços e da sua boa-vontade".

A propósito, podemos esclarecer que foi, realmente, durante o governo de Custódio Miguel Borja, em Macau, que foi criado o Liceu Nacional Infante D. Henrique, daquela cidade, em 30 de Junho de 1893. as também não podemos deixar passar sem referência que na monografia do estabelecimento, publicada pelo P. Manuel Teixeira em 1969, para comemorar o seu Jubileu de diamante, não aparece o seu nome como personalidade destacada na sua fundação. Nesse mesmo ano comemorou-se em Luanda o Jubileu de ouro do Liceu Nacional Salvador Correia, publicando-se também uma monografia evocativa da sua actividade e da actuação daqueles que ali trabalharam em cinquenta anos da sua existência.

* * *

No dia 1 de Agosto de 1906, o agrónomo José Joaquim de Almeida foi encarregado de organizar o projecto da instalação em Luanda de uma Escola Elementar Agrícola, delineando o esquema orçamental correspondente, de modo a poder ser interpretado e ampliado o pensamento que presidiu à elaboração do decreto que organizou o ensino profissional nos territórios ultramarinos.

No dia 3 de Janeiro de 1907, o governador-geral Eduardo Augusto Ferreira da Costa fez publicar uma portaria em que se esclarecia terem dado entrada no Governo-Geral os projectos relativos à criação da Escola de Artes e Ofícios e Escolas Elementares de Agricultura, que haviam sido pedidos aos governadores dos distritos, através da portaria provincial de 29 de Julho anterior (no texto a que nos referimos vem indicado Agosto, por erro evidente). Tornava-se necessário apurar, a partir dos trabalhos apresentados, princípios básicos que pudessem ser adoptados em toda a Província e regras de conjunto, harmonizando-se com as possibilidades financeiras do Governo-Geral e fazendo dessas escolas o primeiro grau da instrução profissional e técnica, que convinha difundir em Angola. Para isso era nomeada uma comissão encarregada de proceder, a partir daqueles projectos, à elaboração de outro, que pudesse servir de tipo a cada uma das diversas escolas a estabelecer. Deveria ter em conta a economia financeira, o sistema de instrução prática a adoptar, a escolha dos lugares destinados ao estabelecimento dessas escolas, adoptando-se o princípio de que se procuraria criar uma em cada distrito, e além disso a ordem de prioridade a seguir na construção dos edifícios. Os membros da comissão a que acima se fez referência eram os seguintes:

—Ernesto Augusto Gomes de Sousa, inspector da Escola Profissional D. Carlos I;
—José Rodrigues do Amaral Temudo, engenheiro-director da Direcção das Obras Públicas;
—Alberto de Sousa Maia Leitão, facultativo médico de 1ª classe;
—António José do Sacramento Monteiro, agrónomo;
—Ralph Lusitano Delgado de Carvalho, professor da Escola Profissional D. Carlos I.

* * *

Reconheceu-se o interesse em modernizar a técnica da cultura da terra em Angola, a fim de conseguir tirar dela resultados mais atraentes, pondo de parte processos obsoletos e métodos primitivos. Quase todos estavam de acordo quanto à necessidade de vulgarizar noções mais racionais, em estabelecimentos de ensino e aprendizagem prática adequados. Em 20 de Março de 1906, tinha sido já aprovado um regulamento pelo qual deveria orientar-se a ciência agrícola a ministrar nas escolas da especialidade.

No dia 25 de Julho de 1912, foi determinado que a Inspecção da Agricultura criasse em Angola, com a possível urgência, o Serviço de Ensino Agrícola Elementar, que começaria com a instituição de uma Escola Prática Agrícola, em Luanda. O respectivo curso teria a duração de dois anos. No primeiro, procurar-se-ia que os alunos aprendessem a ler e a escrever; para isso seria nomeado um professor de instrução primária, a quem seria confiada a tarefa da alfabetização dos instruendos. Ao fim de dois anos de estudo e prática agrícola, os alunos seriam submetidos a exame. Os termos do diploma a que nos estamos referindo são bastante taxativos, pelo que será lógico aceitar que todos fossem obrigados a prestar provas. Este diploma apoiava-se noutro, anterior, publicado com data de 27 de Maio de 1911.

Naquela mesma data, 25 de Julho de 1912, foi determinado que se aproveitasse para a instalação dos Serviços Centrais de Agricultura um edifício do Estado, que não podia já servir para o fim que se tivera em vista quando foi construído — e que a pretexto de ser uma escola com internato, deveria ser, na realidade, um recolhimento de religiosas. Na linguagem do diploma legal, o fim útil que se procurava atingir, se havia algum, continuaria daquele modo a manter-se, pois iria instalar-se ali uma escola agrícola para indígenas. Não devemos errar muito se admitirmos a hipótese de o edifício referido ter sido construído para as Irmãs Educadoras, pouco antes expulsas deste território, em cumprimento de uma medida legal muito discutível...

Ao lado, havia um terreno baldio que permitiria a instalação do parque veterinário, estação zootécnica, horto de ensaio e jardim experimental. O edifício em questão e o terreno a que se fazia referência ficavam no Largo do Carneiro, próximo da Avenida Brito Godins, sítio também conhecido por Alto das Cruzes, por ficar perto e no caminho que levava ao cemitério público. Corresponde, aproximadamente, ao que se chamou Largo dos Lusíadas, vulgarmente conhecido por Largo da Maria da Fonte, designação alusiva ao monumento aos mortos da Primeira Grande Guerra, que ali se erigiu.

Hesitamos em admitir que a denominação de Largo do Carneiro se refira ao nome do útil animal doméstico assim chamado, que quase não existe nesta região angolana. Talvez se relacione com a existência do cemitério, que na linguagem portuguesa arcaica aparecia tendo como sinónimo o vocábulo "carneiro". Perto do local houve dois campos de sepulturas, e hoje há ainda um; o do poente era reservado para os escravos que morriam antes do embarque, dando origem ao nome actual do bairro ali construído, Maculusso, que nada mais é do que a deturpação da locução "uma cruz".

Os Serviços Centrais de Agricultura compreendiam as seguintes repartições: — Inspecção de Agricultura de Angola; Laboratório Químico-Agrícola de Luanda; Laboratório Veterinário de Luanda; e Mostruário Comercial dos Produtos Agrícolas de Angola (que havia sido criado no dia 9 do mesmo mês).

A Escola Prática Agrícola de Luanda foi inaugurada no dia 6 de Outubro desse mesmo ano de 1912. As bases orgânicas relativas ao seu funcionamento, inclusive as condições de matrícula dos seus alunos, foram elaboradas pela Inspecção de Agricultura de Angola. Começar-se-ia com vinte alunos, no primeiro ano lectivo, e o curso teria a duração de dois anos. O primeiro período de matrículas, contudo, não teve grande afluência de interessados, pelo que teve de ser prorrogado por mais trinta dias. Exercia então o cargo de inspector, nos Serviços Centrais de Agricultura de Angola, Francisco Coelho do Amaral Reis, visconde de Pedralva, que mais tarde chegou a desempenhar o cargo de governador-geral, tendo deixado o seu nome indelevelmente ligado à expansão do ensino nesta província, como na devida altura teremos ocasião de relatar.

A Escola Prática Agrícola de Luanda foi remodelada ainda no tempo de Norton de Matos, em 4 de Março de 1914, o que demonstra ter sido mal estruturada e não corresponder às necessidades e interesses gerais. Infelizmente, muitas iniciativas empreendidas nos princípios deste século deixaram de produzir os frutos que seria lógico esperar delas, devido a não ter sido respeitado o condicionalismo social, atendendo apenas a um idealismo pouco sensato, com muito de utópico! Pouco depois veio a ser suspensa, em 16 de Novembro de 1917. Tentou-se ainda restaurá-la, no que se empenhou o visconde de Pedralva, em 23 de Agosto de 1919, ano grande da história do ensino em Angola, mas não conseguiu vingar. Esta personalidade deveria vê-la com olhos muito benévolos, pois não deixaria de a considerar obra sua!

Reconhecendo-se que a preparação dos alunos da Escola Prática Elementar de Agricultura, como também por vezes era conhecido aquele estabelecimento de ensino, era grandemente deficiente, e tendo em consideração que as escolas regionais deste género poderiam oferecer maiores vantagens, Norton de Matos determinou, logo no início do seu segundo mandato, que aquela escola, restaurada por Francisco Coelho do Amaral Reis, fosse transferida para a Estação Agronómica do Cazengo, passando a ter a designação de Escola Prática Elementar de Agricultura do Cuanza-Norte. Também aqui os resultados foram pouco animadores!

O governador-geral de Angola, Jaime Alberto de Castro Morais, aprovou em 18 de Abril de 1918 o Regulamento da Escola de Agrimensura. Tinha sido fundada, em 28 de Janeiro de 1916, por Fernando Pais Teles de Utra Machado, que então exercia as funções de governador-geral. Segundo o aviso publicado no órgão oficial da província, deve ter começado a funcionar no dia 26 de Novembro de 1917. Teve novo regulamento e novos programas em 1940, aprovados em 18 de Setembro anterior. A sua crónica dilui-se no tempo, não deixando realizações que merecessem registar-se.

Por portaria de 13 de Novembro de 1907, o governador-geral de Angola, Henrique de Paiva Couceiro, criou o Horto Experimental de Cazengo, na Granja de São Luís, tendo sido encarregado de o dirigir o famoso botânico alemão, ao serviço de Portugal, John Gossweiller, que muito trabalhou por Angola, amando tanto esta terra que aqui quis ser sepultado, apesar de ter falecido em Lisboa. No dia seguinte, 14 de Novembro, Paiva Couceiro nomeava Alfredo Martiniano Pereira para fazer o estudo das regiões próximas de Luanda e com acesso fácil a partir da linha férrea, com vista ao aproveitamento futuro desses terrenos e sua transformação em campos algodoeiros, cuja cultura procurava intensificar-se nesta província.

Em Março de 1908, Paiva Couceiro propôs o aumento da competente verba no Orçamento-Geral de Angola para criar em Luanda uma Escola de Auxiliares de Cartógrafos. Pretendia que nela fossem ministrados a alguns sargentos das forças militares, que se reputassem mais aptos, os elementos de instrução indispensáveis para poderem vir a manejar eficientemente o sextante, o teodolito, o cronómetro, o telémetro, etc., preparando-se para virem a ser auxiliares eficazes na determinação exacta das coordenadas geográficas e outros serviços de topografia e geodesia.

Henrique Mitchel de Paiva Couceiro começou o seu governo sob os melhores auspícios. Logo no dia 4 de Julho de 1907 (ele tomara posse a 17 de Junho), nomeou uma comissão encarregada de estudar as condições que o sertão de Benguela e Lobito podia oferecer à colonização europeia. Essa comissão era constituída por:

—José Pereira do Nascimento, eminente naturalista e defensor da colonização branca no centro e sul de Angola;
—António José do Sacramento Monteiro, agrónomo;
—João Maria Ferreira do Amaral, tenente do exército.

Em Março de 1912, o ministro nomeou António Amor de Melo para função idêntica. Deveria fazer o estudo da climatologia de Angola e outras províncias ultramarinas, com vista à fixação de colonos europeus e povoamento branco das terras da África. As condições de trabalho, porém, eram francamente desanimadoras, pois somente tinha direito ao abono de transporte. A empresa estava, naturalmente, condenada ao fracasso, não podendo esperar-se dela resultados satisfatórios. Se houvesse interesse político, as condições seriam bem diferentes!

* * *

No dia 3 de Outubro de 1912, o governador-geral José Mendes Ribeiro Norton de Matos assinou uma portaria que criava, em Luanda, uma escola profissional destinada à educação e ensino das crianças indígenas do sexo feminino, em regime de semi-internato, absolutamente gratuitos. A instrução literária ali ministrada consistiria apenas na elementar, isto é, a matéria correspondente ao exame de primeiro grau, depois chamado exame de terceira classe. O ensino profissional inclinava-se para os trabalhos domésticos e actividades femininas, como costura, confecção de peças simples de vestuário de uso comum, utilização da máquina de coser, feitura de meias e bordados, desenho de ornatos, culturas familiares, noções dos misteres caseiros, culinária, higiene domiciliar, puericultura, enfermagem, cuidados a ter com as parturientes. Como complemento da formação de base, as alunas que revelassem possuir qualidades destacadas seriam iniciadas em actividades relacionadas com a função de empregadas públicas ou de escritório, aprendendo dactilografia e a trabalhar com aparelhos de telegrafia.

A escola seria mantida com subsídios anualmente subscritos no Orçamento-Geral de Angola, subsídios da Câmara Municipal de Luanda ou de quaisquer outras associações de assistência pública, donativos de particulares, produtos de subscrições, festas, espectáculos públicos, rifas e leilões de benemerência.

A inauguração daquele estabelecimento de ensino realizou-se no dia 5 de Outubro de 1912, data do segundo aniversário da proclamação da República. A cerimónia consistiu no lançamento da primeira pedra para a construção do respectivo edifício. A abertura oficial da escola foi marcado para o dia 31 de Janeiro de 1913. Primeiramente esteve a funcionar na Avenida Álvaro Ferreira, vulgarmente conhecida por Avenida do Hospital, antes de se fixar no edifício próprio.

O regulamento provisório recebeu a aprovação das autoridades no dia 22 deste mês. No primeiro ano de funcionamento previa-se a admissão de quinze alunas indígenas, sendo expressamente excluídas as meninas europeias e filhas de europeus, embora nascidas em Angola.

Segundo informa Rodrigo Abreu, que foi chefe da Repartição Superior da Administração Política e Civil, em Luanda, conforme consta no seu livro Vida Preciosa — D. Ester Norton de Matos, esta escola foi criada por sugestão e iniciativa da esposa do governador-geral; a Câmara Municipal de Luanda, chamada a colaborar, quis que lhe fosse atribuído o nome da distinta senhora, que entretanto transferiu essa honra para sua filha, Rita Norton de Matos.

Como curiosidade, podemos afirmar que muitas pessoas apoiaram a iniciativa, a que foi atribuída uma importância e interesse excepcionais. Merece referência particular o médico luandense, Dr. Miguel do Sacramento Monteiro, que se prontificou a ensinar voluntária e gratuitamente nesta escola. Assim o afirma a portaria da sua nomeação, que tem a data de 26 de Fevereiro do 1913.

A lotação da Escola Rita Norton de Matos foi elevada, em 22 de Outubro de 1914, para sessenta alunas. Podemos esclarecer que, ao princípio, a afluência de inscrições não foi grande. A população beneficiada não deveria vislumbrar nela grandes vantagens, até porque não tinha tradição escolar; no entanto, é possível que, pouco a pouco, fosse reconhecendo nela o seu verdadeiro interesse. Poderá, contudo, ter-se presente que, mesmo nos últimos anos da presença portuguesa, a sua projecção em Luanda não era grande, exercendo acção limitada que se esbatia entre muitas outras escolas de maior renome.

Em data indeterminada mas que podemos localizar no primeiro trimestre do ano de 1915, declarava-se que a Escola Rita Norton de Matos dependia da Secretaria dos Negócios Indígenas, pelo menos quanto à escrituração das suas contas monetárias. E em 20 de Outubro de 1916 foi-lhe concedido um subsídio governamental de 1.362$00, para fazer face às despesas do funcionamento no ano lectivo de 1916-1917. No dia 8 de Março de 1913, tinha sido publicada uma lista de donativos recebidos para a sua manutenção, cuja soma atingia 1.616$00; nesta importância estava incluído um subsídio eventual de 1.000$00 de Santa Casa da Misericórdia.

Norton de Matos prestou grande atenção à difusão escolar em Angola, nomeadamente a que dizia respeito à preparação profissional, ao sector mais tarde designado por ensino técnico elementar. Sendo homem do seu tempo e bem dentro da mentalidade da sua época, era defensor entusiasta das escolas-oficinas, no que seguiu os passos antes apontados por outras individualidades de relevo. Infelizmente, as diversas iniciativas que tentou não deram o resultado previsto, sobretudo porque lhes faltava o apoio de base, os fundamentos que criassem raízes no interesse e nas aspirações sociais. Como se desprezou este ponto, a tentativa ruiu estrondosamente. Deve salientar-se que, tendo criado bom número de estabelecimentos, sobretudo no seu segundo período de governo, grande parte deles nunca entrou em funcionamento. Norton de Matos era um político, e por isso foi dominado pelo condicionalismo social que o rodeava, tanto em Angola como sobretudo em Portugal.

Em 16 de Janeiro de 1913, foi criada em Pungo Andongo uma escola de instrução primária do primeiro grau (mais tarde os estabelecimentos deste tipo foram designados postos escolares); tinha anexa uma oficina de carpintaria e um horto de culturas agrícolas. Nada se sabe dos resultados obtidos, mas estamos convencidos de que não foram notórios.

Foi fundada ainda, em 9 de Outubro de 1913, na circunscrição civil de Nóqui, a Escola Profissional Agrícola Afonso Costa, que deveria ser mantida a expensas do município local. Também não há notícia de que a sua acção tenha sido frutuosa, desconhecendo-se inteiramente a sua história. Sabe-se, no entanto, que chegou a entrar em funcionamento, embora o período de duração e actividade não fosse muito prolongado.

No dia 26 de Março seguinte, era criada no Bié a Escola Profissional Pátria Nova, para o ensino das crianças daquela povoação. Foi aprovado nesse mesmo dia o respectivo regulamento. Este estabelecimento era destinado a receber educandos dos dois sexos.

Em 17 de Novembro do mesmo ano de 1914, criava-se a Escola Profissional de Caconda, para o sexo masculino, sendo aprovado o respectivo regulamento. Devia ser sustentada pela Comissão Municipal daquele concelho. Passou a ser conhecida pelo nome do seu fundador, o famoso estadista e governador-geral Norton de Matos. No dia 6 de Junho de 1917, foi aberto concurso para o provimento de um lugar de professor da Escola Profissional Norton de Matos, de Caconda, e também para o de mestre da escola municipal mista do Lobito. Ignoramos o resultado; no entanto, sabemos que a 13 de Junho foi pedido ao Ministério das Colónias que fosse aberto concurso para o provimento dos lugares referidos, sendo respondido que deveriam ser os respectivos municípios a promovê-lo, submetendo depois os professores classificados e nomeados, nos termos da lei, à confirmação do governador-geral, para que o ensino por eles ministrado pudesse ter validade oficial.

Algum tempo depois, tendo saído já de Angola o conhecido governador, foi fundada uma escola de habilitação profissional elementar em Benguela, por iniciativa do núcleo local da Liga Nacional de Instrução. Recebeu o nome do governador-geral de Angola, Eduardo Costa, prestando deste modo homenagem a esta destacada figura da sua história. Reconhecendo o valor e o interesse deste estabelecimento de ensino, o governador-geral Jaime Alberto de Castro Morais estabeleceu um subsídio anual de três contos , para auxiliar a fazer as despesas da sua sustentação, devendo ser subscrito pelas circunscrições e concelhos que pudessem vir a ser beneficiados por ele.

Este mesmo governante, Jaime de Morais, criou em 18 de Abril de 1918, a Escola Marítima de Moçâmedes; tal estabelecimento de ensino não deixou tradição, tendo pouco depois, em 23 de Agosto de 1919, sido fundada a Escola Primária Superior, mais tarde conhecida por Escola Prática de Pesca e Comércio. Era claramente indicada a sua finalidade, dizendo-se que seria uma escola prática de ensino e aplicação das artes e indústrias marítimas. Teve ainda a designação de Escola Industrial Marítima de Moçâmedes.

O seu curso preparatório tinha a duração de dois anos e pretendia ministrar aos alunos o ensino primário complementar, o que só pode conceber-se se soubessem já ler e escrever correntemente e efectuar as operações aritméticas. Estava previsto que, além da parte literária propriamente dita, aprendessem outras coisas, como ginástica educativa, exercícios paramilitares, natação, remo, trabalhos de velame, cordoaria e calafate. Deveriam estudar também os acidentes geográficos litorais de Angola, sobretudo os da costa do distrito de Moçâmedes, a influência e orientação predominante dos ventos, correntes, etc.. Eram ainda ministradas aos alunos noções relacionadas com a História da Colonização do Sul de Angola.

O curso especial, que durava também dois anos, consistia no estudo de Aritmética e Geometria, Físico-Química, Ciências Histórico-Naturais, Legislação, Contabilidade, Escrituração Comercial, Desenho, Indústrias Marítimas, Construções Navais, etc..

A parte prática do curso obrigava a aprender a fazer sondagens, medir a força das correntes, treino na caça à baleia, fabricação de óleos, guanos e colas, curtume de peles. etc..

Pode dizer-se que, em boa parte, esta escola foi transformada, como já mencionámos atrás, na Escola Primária Superior Barão de Moçâmedes, criada em 23 de Agosto de 1919, vindo em 30 de Novembro de 1936 a dar a Escola Prática de Pesca e Comércio, que por natural evolução passou a ser, mais adiante, a Escola Industrial Marítima e Escola Industrial e Comercial Infante D. Henrique.

* * *

Fernando Pais Teles de Utra Machado criou em Luanda, em 10 de Janeiro de 1916, um "curso prático de enfermagem" que seria ministrado na Escola de Enfermeiros, a funcionar no Hospital D. Maria Pia. Teria a duração de dois anos e propunha-se admitir, no primeiro ano lectivo, vinte alunos do sexo masculino e dez do sexo feminino; estas tirariam simultaneamente o curso de parteiras. Reconhecia-se que não era possível prover às necessidades apenas com pessoal europeu, vendo-se até vantagem em que a maior parte do pessoal de enfermagem fosse autóctone. Vem a talho de foice dizer que, no dia 9 de Outubro de 1911, foi aprovado o Regulamento dos Cursos de Enfermagem, indicando as habilitações literárias exigidas para a admissão de sargentos e cabos da Companhia de Saúde de Angola e São Tomé, que então eram comuns.

* * *

No dia 9 de Setembro de 1913, portanto durante o primeiro governo de Norton de Matos, foi fundada em Luanda a Escola de Artes Gráficas, anexa à Imprensa Nacional de Angola. Deveria ser inaugurada no decorrer das comemorações do aniversário da República. Parece que estava prevista a hipótese de englobar a aprendizagem das artes tipográficas, composição, impressão. etc.

A propósito desta escola, recordamos que, no final do século XIX, em 27 de Julho de 1898, foi feito um aviso à população de Luanda e às repartições públicas, comunicando que a 1ª Repartição da Secretaria-Geral havia sido transferida para o edifício destinado à Escola Profissional, no pátio da Imprensa Nacional. Estava em referência o edifício do antigo convento e igreja dos jesuítas.

Na data acima indicada foi aprovado o respectivo regulamento, que entrou imediatamente em vigor. O período de aprendizagem era de quatro anos. A admissão dos candidatos seria feita de acordo com as vagas existentes, estando previsto que comportasse doze aprendizes de composição tipográfica, quatro de impressor tipográfico, quatro de encadernador e um de impressor litográfico.

Em 19 de Agosto de 1911, realizaram-se em Luanda umas invulgares provas de exame, para aquele tempo, pois destinavam-se a apurar a competência de quatro raparigas para professoras de Ginástica. Tratava-se das alunas internas do Asilo D. Pedro V — Aida Carmelino, Alda Lucas, Maria da Conceição e Teodora Monteiro Guimarães — recolhidas desta instituição de beneficência e benemerência. Demonstraram possuir os conhecimentos teóricos e práticos suficientes para poderem dedicar-se a tal actividade, que naquela altura não deveria ter muitos simpatizantes, sobretudo do sexo feminino. Isto indica que a educação ministrada naquela instituição era bastante aberta e actualizada. O júri dos exames era constituído por:

—César Augusto de Oliveira Moura Brás, capitão dos portos;
—António Augusto Dias Antunes, comandante da Fortaleza de São Miguel;
—Jorge Guilherme Garcia Capelo, director interino dos Telégrafos.

O instrutor da classe de ginástica, José da Silva Miguéis, e o director do Asilo D. Pedro V, José Moreira Freire, foram louvados pelo interesse dedicado, em portaria assinada pelo governador-geral de Angola, Manuel Maria Coelho — aquele que o sarcasmo dos luandenses do tempo chamava "homem, mulher e bicho", em alusão ao seu nome.

A escola, que muitos julgam ser uma organização destinada apenas a ministrar noções teóricas e a dar conhecimentos destituídos de valor prático, não pode deixar de atender à razoável preparação dos seus alunos, dando-lhes condições para poderem exercer, melhor do que as pessoas incultas, a sua actividade profissional. Não pode nem deve sujeitar-se inteiramente ao utilitarismo económico, pois a sua finalidade ultrapassa-o, é mais elevada e mais distante, tem em conta as solicitações do espírito. Deve acompanhar de perto as exigências materiais e contribuir para que , também sob o aspecto económico, a sociedade possa avançar e progredir.

A preparação profissional dada pelas escolas de Angola, sobretudo no período considerado no presente capítulo, deixou muito a desejar. Não soube atender às exigências intelectuais e por isso falhou também quanto aos objectivos materiais. Quase sempre fracassam os planos que, atendendo apenas ao espírito, esquecem os interesses materiais; e quase sempre fracassam também as iniciativas que, preocupando-se exclusivamente ou exageradamente com os valores imediatos, olvidam as aspirações do espírito, da imponderabilidade e da imensidade que lhes estão inerentes...



 
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