43. SECRETARIA PROVINCIAL DE EDUCAÇÃO
A criação da Secretaria Provincial de Educação, em Angola, justificava-se devido a ter sido registada extraordinária expansão da actividade cultural, pois os organismos com ela relacionados haviam alargado os seus quadros e as suas funções, contando elevado número de servidores, de diversas categorias. Os responsáveis tinham a intenção de, com ela, acelerar ainda mais a difusão da escolaridade, intensificar a acção desenvolvida, recuperar o atraso antigo e dar às populações a melhor e mais valiosa forma de se elevarem e progredirem.
A extensão da escolaridade justificava, pois, que se autonomizassem esses serviços, aumentando a sua importância. As necessidades clamorosas dos habitantes, quer os que residiam nas maiores cidades quer os que habitavam humildes quimbos, impunham a adopção de medidas tendentes a acelerar o progresso e a pôr à disposição das novas gerações este precioso meio de desenvolvimento.
Torna-se fácil fazer o historial dos poucos anos que se seguiram à criação da Secretaria Provincial de Educação. As iniciativas tomadas dão matéria para relatos pormenorizados e as medidas postas em prática merecem minuciosa análise.
Vendo o problema com objectividade, a suposta facilidade desaparece para dar lugar a uma relativa e compreensível hesitação. As realizações empreendidas só indirecta e difusamente se reflectiram sobre o futuro, não tendo produzido os frutos que deveriam ter dado, por motivos óbvios. Mesmo assim, tiveram funda repercussão nos acontecimentos e proporcionaram condições de vida diferentes das do passado ainda próximo.
Nem tudo correu bem. Nem sempre se escolheu o melhor caminho. Não foi possível encetar a corrida no momento mais favorável. Não se conseguiu enfrentar vitoriosamente todos os obstáculos. Cometeram-se erros cujos resultados são bem manifestos. E se uma parte tem natural desculpa, houve outros que podiam e deviam ter sido evitados.
Torna-se intrincado fazer análise profunda e estudo minucioso dos factos e das suas consequências. A evolução política e social do país, após a independência, tornou isso ainda mais difícil, pois houve um condicionalismo de rotura, verdadeira síncope institucional. No entanto, não deixaremos de tecer leves considerações, baseadas em observação atenta, no convívio de alguns anos com o ambiente local, no contacto estreito com numerosos responsáveis, na qualidade de estudioso dos problemas e de cidadão consciente e responsável.
É possível que a visão panorâmica dos assuntos não permita apreciá-los sob todos os seus aspectos. Poderemos ter opinião discutível e com que nem todos concordem. E se pudéssemos obter declarações de muitos responsáveis, elas apenas justificariam a acção desenvolvida, sem que assumissem a quota-parte da responsabilidade que lhes possa caber.
Podemos marcar o início da actividade da Secretaria Provincial de Educação no dia 1 de Janeiro de 1964. Não é possível fazer a sua crónica sem referir o nome do governante que mais de perto se prende com ela [e que para muitos se confunde com o da instituição], o Dr. José Pinheiro da Silva. Foi o primeiro titular e o que mais tempo se manteve à frente do departamento, tendo desempenhado o cargo durante mais anos do que todos os demais. O desenvolvimento cultural, a expansão da escolaridade ficaram a dever-se em boa parte aos seus esforços e dedicação.
A sua actuação foi reconhecida mesmo por muitos dos seus adversários políticos, que se referiam elogiosamente aos seus méritos de empreendedor.
A estruturação da Secretaria Provincial de Educação, a partir de 1 de Janeiro de 1964, criou em Angola condições novas, que vieram reflectir-se nos resultados futuros. Se o estudo da evolução cultural angolana pode ser dividido em períodos destacados, um deles bem poderia tomar como linha de demarcação este notável acontecimento. No entanto, devemos ter em consideração o pormenor de em data muito próxima terem sido instituídos os estudos universitários — outro marco que também poderia servir para delimitar períodos.
Atendendo à proximidade das datas, sendo a Universidade de Luanda inaugurada em 6 de Outubro de 1963 e a Secretaria de Educação ter funcionado a partir de 31 de Dezembro do mesmo ano, podemos aceitar os dois factos como simultâneos, sem dificuldade e sem qualquer tipo de susceptibilidade. Embora se trate de entidades distintas, pois os Estudos Universitários integraram-se na "Universidade Portuguesa" sem subordinação directa ao Governo-Geral de Angola, a não ser para a abertura de créditos financeiros necessários ao seu funcionamento, tinham ambas a finalidade de promover e facilitar a instrução e a cultura intelectual.
A Secretaria Provincial de Educação abrangia as seguintes principais dependências:
—Gabinete do Secretário Provincial;
—Inspecção do Ensino;
—Direcção dos Serviços de Educação;
—Instituto de Investigação Científica de Angola;
—Mocidade Portuguesa;
—Mocidade Portuguesa Feminina;
—Conselho Provincial de Educação Física.
Os problemas relativos à Secretaria Provincial de Educação foram confiados ao zelo do secretário provincial de Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência, que então era o Dr. João Baptista Duarte Pinheira, enquanto não fosse nomeado um titular. Isso veio a acontecer no dia 20 de Março de 1964, sendo escolhido para o cargo o professor assistente dos Estudos Gerais Universitários de Angola, Dr. José Pinheiro da Silva [que nunca chegou a leccionar neste estabelecimento de ensino]. Tomou posse do lugar, em Lisboa, no dia 23 e entrou em exercício, em Luanda, no dia 26 de Março daquele ano.
A título de curiosidade, apontaremos neste momento que o lugar foi apenas ocupado por quatro individualidades: — Pinheiro da Silva, Stott Howorth, Alambre dos Santos e Marques Pinto (este com a designação de "Secretário de Estado", pois fazia parte do Governo Provisório nomeado depois de mudança de regime político, em Portugal). Com a tomada de posse do Governo de Transição de Angola, em 31 de Janeiro de 1975, ascendeu ao cargo de "Ministro da Educação Nacional" o militante de União Nacional para a Independência Total de Angola, UNITA, Jerónimo Wanga.
Um dos primeiros problemas que houve necessidade de enfrentar logo a seguir foi o da instalação dos serviços burocráticos, pelo que se deu início à construção de um bom imóvel, ladeado por edifícios de menores dimensões, para departamentos integrados mas de feição diferente. Quando chegou o momento de Angola ascender à independência, o Ministério da Educação e Cultura encontrou condições que permitiram alojar bem as distintas secções. Não podemos registar datas que se relacionem com a construção; apenas podemos referir que, em 22 de Dezembro de 1967, era autorizada a aquisição de dois elevadores para o edifício dos Serviços de Educação, já em fase adiantada, tendo pouco depois transitado para ali as diversas repartições, até então disseminadas por vários locais, por vezes distantes entre si.
Com a data de 19 de Dezembro de 1964, era atribuída aos Serviços de Estatística Geral a obrigação de elaborar e manter actualizadas todas as informações relativas à estatística do ensino. Os respectivos dados seriam incluídos na publicação que aquele organismo costumava empreender, adoptando-se a designação genérica de Estatística da Educação. Ao mesmo tempo eram determinados os modelos oficiais a adoptar e definidos os prazos que cada responsável, entidade ou organismo, deveria respeitar e cumprir. A condensação dos dados referentes às escolas e aos professores no departamento especializado veio facilitar muito a consulta; as próprias autoridades se serviam dela, por mais fácil e rápida, mesmo quando podiam encontrar nos seus arquivos os elementos procurados.
Eram obrigados a fornecer dados respeitantes ao ensino todos aqueles que tivessem a responsabilidade da direcção dos estabelecimentos — reitores universitários, liceais ou de seminários; directores de institutos, escolas industriais e comerciais, magistério primário, habilitação de professores de posto, técnicas de qualquer especialidade; missões religiosas de todas as confissões; escolas primárias e postos escolares; escolas particulares. A estatística do ensino primário, por determinação oficial, deveria ser feita através das secções ou repartições escolares distritais, que a enviariam ao seu destino.
Em 11 de Agosto de 1965, o Ministério da Educação Nacional, de Lisboa, foi autorizado a conceder vantagens aos estudantes que prestassem ou tivessem prestado já o serviço militar. Travava-se nessa altura a guerra da libertação dos territórios ultramarinos, para a qual foram chamados milhares de jovens, muito recrutados entre os estudantes e que por isso se sentiam prejudicados. As autoridades portuguesas tomaram medidas tendentes a minorar esses prejuízos e também a só interromperem os estudos para cumprirem o serviço militar quando o aproveitamento não fosse positivo. Numerosos estudantes puderam concluir os seus cursos antes de se integrarem na tropa; e os que foram constrangidos a incorporar-se não deixaram de ser beneficiados com vantagens excepcionais. Os militares dispunham de várias épocas de exame, em todos os graus do ensino, durante dilatado período, mesmo depois de concluírem as obrigações castrenses.
No dia 26 de Abril de 1966, era mais pormenorizadamente regularizada a preferência na colocação de professores, nas localidades onde os respectivos cônjuges desempenhassem funções públicas, com carácter estável. A ordem de prioridade seria estabelecida tendo em conta:
—Professores casados com professores;
—Professores casados com outros funcionários;
—Professores viúvos, separados judicialmente, ou que tivessem
filhos a estudar em estabelecimentos de grau que não houvesse na
localidade;
—Professores que tivessem maiores encargos familiares.
Foram publicadas em 6 de Maio de 1967 as normas de funcionamento da Inspecção Provincial de Educação, organismo integrado na estrutura burocrática respectiva e que se dizia ter sido estabelecido em moldes diferentes dos antigos, por determinação de 20 de Julho de 1965. Eram, segundo as diversas garantias, ordenadas desta maneira:
—Nomeação para cargos directivos;
—Contacto com os professores, em orientação pedagógica,
fiscalização e apuramento de competência e dedicação
profissional;
—Organização de horários e turmas nos estabelecimentos
de ensino, sobretudo nos que fossem regidos por agentes menos classificados;
—Realização de provas de passagem de classe e exames
finais de ciclo;
—Estabilização do pessoal docente e sua fixação
quanto a localidades e estabelecimentos;
—Abertura de escolas e colégios, envidando esforços para
que o edifício e o pessoal satisfizessem as exigências de
segurança, moralidade e competência pedagógica;
—Reunião de indicações exactas quanto às
relações que deveria fomentar e procurar manter entre os
diversos sectores dos serviços e destes entre si, pondo em destaque
a colaboração que deveria prestar à Direcção
dos Serviços de Educação — de que se considerava organismo
paralelo, seu complemento e suplemento.
Em 15 de Dezembro do mesmo ano de 1967, foram feitas alterações ao regime de férias escolares, determinando-se que seriam assim:
—Férias de Natal — Do dia 19 de Dezembro ao dia 3 de Janeiro,
inclusive;
—Férias de Carnaval — De sábado a quarta-feira,
inclusive;
—Férias de Páscoa — De 5 a 31 de Março,
inclusive; nos anos em que a Páscoa não fosse abrangida,
seriam feriados os três últimos dias da Semana Santa, de quinta-feira
a sábado.
Determinava-se ainda que, em nenhum caso, as férias podiam ser antecipadas ou prolongadas, nem mesmo para trabalhos escolares, como reuniões de averiguação do aproveitamento discente. Devemos, no entanto, lembrar, quanto a este pormenor, que sempre se anteciparam e prolongaram, umas vezes com a complacência dos professores e outras vezes por iniciativa dos alunos. Estes aproveitavam a oportunidade para darem larga à euforia do fim do período ou ano escolar, chegando por vezes a registar-se abusos. Acontecia algo semelhante no início do ano lectivo, pondo em prática as praxes académicas, manifestações obsoletas que quase sempre denunciam mau gosto e péssima educação; representam muitas vezes falta de civismo para com os outros e de respeito por si próprio.
A legislação referente ao ensino, nomeadamente o ensino primário, estava muito desactualizada e dispersava-se por numerosos diplomas. Reconhecendo-se a necessidade de pôr ordem neste aspecto, foi elaborado novo Regulamento do Ensino Primário Elementar, publicado com a data de 7 de Agosto de 1968.
Um despacho lavrado em 17 de Julho de 1970 autorizou a realização de exames nos estabelecimentos de ensino particular; reconhecia-se que prestavam relevantes serviços à educação e colaboravam com os poderes constituídos na difusão da cultura popular e divulgação da alfabetização; aceitava-se ainda que poderiam colher-se melhores frutos do que os até então produzidos se houvesse mais perfeita colaboração com o sector oficial, cooperando harmoniosamente com os seus professores na consecução do objectivo comum. Era isto o que afirmava o diploma oficial em questão; pode, porém, pôr-se em dúvida que fosse exactamente assim; na sua quase totalidade, as escolas particulares funcionavam tendo em vista o interesse material, contribuindo até para a manutenção de barreiras sociais por serem refúgio dos filhos de famílias de maiores proventos — espalhando o conceito de que o seu nível de ensino era mais elevado, o grau de educação mais destacado, a eficiência pedagógica mais frutuosa, a procedência dos seus alunos mais seleccionada.
Nem tudo era verdade, mas nem tudo seria invenção. Havia muitos europeus e alguns africanos que, por pruridos de classe, preferiam os colégios às escolas oficiais, que ofereciam apenas horários mais adequados e maior permanência diária na escola, pois as aulas públicas estavam sobrecarregadas e superlotadas. Não seremos injustos se dissermos que, salvo poucas e honrosas excepções, por tal motivo ainda mais honrosas, os responsáveis pelas escolas particulares não souberam nem quiseram honrar a meritória actividade a que se dedicavam, que grande número desacreditou!
Em 1 de Outubro de 1970, foi criada a Telescola, serviço público destinado a servir a difusão da cultura e a incentivar a escolaridade, por meio de cursos ministrados através da radiodifusão. Simultaneamente, regulava-se em esquema o seu funcionamento e actividade. Outro diploma, ou seja, o despacho de 28 de Outubro, criou cursos de adultos que poderiam funcionar ao abrigo de portaria em referência, regulamentando melhor a estruturação da Telescola, que não passou de tentativa débil e experiência sem base sólida; nunca houve o cuidado de preparar mestres que produzissem e ministrassem boas lições, com planos mais perfeitos e realizados com melhor técnica. O que se tentou carecia de eficiência; os autores não conheciam a prática radiofónica; os realizadores nada sabiam de pedagogia nem de didáctica; os locutores tentavam cobrir defeitos que algumas vezes ainda aumentavam, e suprir qualidades que até frequentemente conseguiam desvanecer... Não se afastou o nosso tradicional defeito, o uso e abuso do improviso, com todas as suas consequências.
No dia 22 de Agosto de 1972, foi tornada extensiva ao Ultramar português a disposição legal que instituía a gratuitidade relativa à escolaridade obrigatória a ministrar pelas escolas preparatórias públicas e postos oficiais da Telescola. O respectivo diploma tinha sido promulgado em 20 de Junho do mesmo ano.
Muitas pessoas insurgiam-se contra a manutenção da licença graciosa, concedida aos funcionários públicos e empregados mais categorizados das principais empresas comerciais e industriais. Dizia-se constituir uma prerrogativa colonialista, outrora só concedida aos europeus. Até perto dos meados do século XX, apenas os funcionários cuja origem natal fosse estranha ao território podiam gozar deste dilatado período de férias, com direito a viagens gratuitas e ao vencimento integral. Havia entre os africanos que defendesse o seu alargamento aos naturais — talvez para ascenderem ao nível dos brancos, talvez porque pensassem que, não sendo isso possível, por impraticável, seria uma boa forma de a combater!
A tradição das licenças graciosas tinha os seus detractores que a impugnavam como labéu colonialista; tinha também impugnadores decididos entre os funcionários mais humildes, que viam nela uma forma de favorecer os privilegiados, por eles não terem condições de a usufruírem. Na verdade, nem todos podiam dar-se ao luxo de fazer turismo durante vários meses — que alguns funcionários conseguiam ainda dilatar mais!
Havia ainda outro inconveniente, que se sentia mas a que só demasiado tarde pôde, soube ou quis dar-se remédio — a perturbação ocasionada na manutenção dos serviços. Quanto aos professores e funcionários judiciais, via-se haver possibilidade de fazer coincidir a licença graciosa com as férias normais. Tendo isso em consideração, o decreto de 17 de Abril de 1973 determinou que os professores, de qualquer grau do ensino, gozassem a licença graciosa de dois em dois anos (em vez de cinco em cinco de anteriormente) durante as férias grandes anuais, sem as ultrapassar, utilizando nas suas deslocações o transporte aéreo por conta do Estado. Este diploma foi publicado em Angola no dia 27 de Abril e aplicado já nesse ano. Pouco antes tinha sido imposta esta medida aos funcionários judiciais, o que nos leva a concluir que as autoridades têm dificuldade em coordenar medidas e simplificar a burocracia!
Em 18 de Dezembro do mesmo ano de 1973, foi aprovado e publicado o Estatuto Orgânico da Secretaria Provincial de Educação, assim como das demais que constituíam o Governo-Geral de Angola. Introduziu-se nessa ocasião, no conjunto de serviços dela dependentes, o Gabinete de Estudos e o Gabinete de Relações Públicas, de cuja actividade se esperavam bons resultados. A evolução política, porém, veio alterar e inutilizar todos estes projectos!
Em 25 de Janeiro de 1975, publicava-se um diploma que regulava o funcionamento dos chamados órgãos escolares tradicionais do Ensino Preparatório e Secundário, sendo revogada toda a legislação que se lhe opusesse. Os títulos que se encontram no corpo do decreto-lei diferem do que vem no sumário do Boletim Oficial de Angola, daquele dia, e são:
—Da Gestão dos Estabelecimentos de Ensino Preparatório
e Secundário;
—Da Comissão Pedagógica;
—Do Conselho Administrativo;
—Do Conselho Disciplinar;
—Da Comissão de Escola;
—Das Assembleias.
Devemos ter presente que por aqueles dias se registou uma verdadeira enchente de documentos legais a alterar profundamente as estruturas de grande número de actividades, públicas e particulares. Estava a terminar o período de governação de Rosa Coutinho, discutida figura do plano colonial luso-angolano, e foram promulgados diplomas de cuja validade desde logo se duvidou; alguns foram conservados, mas outros imediatamente abolidos; toda a gente se convenceu de que pretendia marcar posição clara e encaminhar a evolução do processo de descolonização em sentido premeditado, antecipando-se ao Governo de Transição, que tomou posse no último dia daquele mês, mas que os acontecimentos futuros vieram demonstrar não dispor de condições que permitissem fazer obra construtiva e realizar a pacificação do sacrificado povo angolano, duramente martirizado!
Desde muito cedo começou a verificar-se que grande número de funcionários angolanos, de todos os ministérios, e mesmo de importantes empresas privadas, requeriam a concessão de licenças disciplinares, licenças por motivo de doença e outras, abandonando o território. Atendendo a que esse mal se manifestou de forma alarmante no sector educativo, em 24 de Junho de 1975 foi determinado que todos os funcionários, técnicos e burocráticos, do Ministério da Educação e Cultura regressassem aos seus lugares logo que as licenças concedidas se esgotassem. A maior parte deles requeria o prolongamento dos períodos, utilizando razões muito especiosas. Esta atitude foi considerada como sabotagem ao processo de descolonização, demolidora das estruturas e eminentemente reaccionária. A atitude dos responsáveis baseou-se nos muitos abusos e subterfúgios registados. Quem assim procedia apenas procurava ganhar tempo, pois não tencionava regressar a Angola, onde começava a sentir-se a insegurança e a reinar o caos; logicamente, os visados não regressaram e muitos outros começaram a preparar a sua saída do país — concluindo-se que a publicação desta ordem não conseguiu o objectivo visado e até contribuiu para agravar o mal que pretendia atalhar.
Vamos dedicar algumas páginas ao problema das atribuições governamentais e delegação delas em funcionários responsáveis. A responsabilidade principal da governação, no sistema colonial português, no de correr das últimas décadas em que se manteve, cabia ao Ministério do Ultramar e ao Governo-Geral (no caso específico de Angola). Em dada altura, reconhecendo-se a impossibilidade de atender oportunamente a todos os problemas, e também para simplificar um tanto o esquema burocrático, foi delegada grande parte da competência nos secretários provinciais, que por sua vez a transmitiam aos funcionários superiores, instituindo a especialização administrativa. Viu-se que a medida era acertada e que deveriam alargar mais a rede da competência governativa. Por isso, em 13 de Março de 1971, o Dr. António Henrique de Araújo Stott Howorth, que pouco antes começara a desempenhar as funções de secretário provincial, delegou grande parte das suas atribuições no director dos Serviços de Educação. Podemos fazer ideia do volume de encargos de que se libertava se atendermos a que a respectiva portaria englobava nada menos de vinte e quatro alíneas discriminativas.
No dia 21 de Julho de 1971, foi "delegada no director provincial dos Serviços de Educação, nos reitores dos liceus directores de todos os estabelecimentos de ensino secundário e médio e, bem assim, nos directores das repartições escolares distritais a competência para conferirem posse e receberem a prestação do juramento dos respectivos funcionários". Colocavam-se, pois, muitas coisas nos seus devidos lugares, aliviando os principais responsáveis de uma parte das suas muitas tarefas, simplificando os serviços, dando-lhes maior rapidez e eficiência. No entanto, nem em tudo se conseguiu afinar a máquina burocrática e, como exemplo, recordaremos que os requerimentos continuavam a ser dirigidos a entidades diferentes das que os despachavam, ficando sujeitos a maior demora e também à ineficiente exigência do reconhecimento notarial da assinatura; careciam de ser ilustrados com notas e informações por vezes ridículas mas sempre morosas e cansativas. Não houve a coragem de eliminar de vez papéis inúteis, muitas vezes forjados sem escrúpulo, mas que tinham de ser apresentados...Não houve a decisão e a clarividência de exigir responsabilidade individual, inculpando os transgressores das leis.
Com o decorrer do tempo deve ter-se verificado que este sistema oferecia vantagens e que o princípio básico estava certo. Em 12 de Janeiro de 1973, foi transferida para o secretário provincial a competência legal para solucionar os assuntos administrativos referentes ao Instituto de Investigação Científica de Angola, até então resolvidos pelo governador-geral. Chamava-se a atenção para o facto de este organismo ter em vista fins estreitamente ligados ao sector educativo, reconhecendo-se ainda a conveniência de o integrar mais intimamente no âmbito dos Serviços de Educação, através da correspondente Secretaria Provincial.
Encontramos novas referências no diploma de 4 de Abril de 1973, pelo qual foram subdelegadas no responsável pela Inspecção Provincial de Educação numerosas atribuições legais anteriormente delegadas no secretário provincial. Na falta de inspector ou no seu impedimento, eram tornadas extensivas ao seu substituto legal, que o substituiria para todos os efeitos, incluindo este. Era então já o responsável pela Secretaria Provincial de Educação o seu último titular, Dr. Manuel Francisco Alambre dos Santos.
No dia imediato, 5 de Abril de 1973, era publicada uma portaria idêntica àquela, em que se delegavam também numerosas atribuições no director dos Serviços de Educação, e mais outra referente ao comissário provincial da Mocidade Portuguesa. E em 7 de Abril outras duas, em tudo semelhantes, que davam idênticos poderes à comissária provincial da Mocidade Portuguesa Feminina e ao presidente do Conselho Provincial de Educação Física. Por fim, já em 26 de Fevereiro de 1975, o titular do Ministério da Educação e Cultura, Jerónimo Wanga, delegou competência para diversos assuntos no inspector provincial, no director e no adjunto do director dos Serviços de Educação.
Sentia-se a necessidade premente de simplificar, poupar tempo, evitar incómodos aos cidadãos. Não houve a decisão de simplificar as estruturas, banir papéis inúteis, organizar os serviços de maneira que os objectivos se alcançassem com menos formalidades. Sustentou-se o sistema ramerranesco e rotineiro que vinha de longe. Fez-se alguma coisa, mas poderia ter-se feito mais...
Com a mudança intempestiva de funcionários, provocada pelo processo de descolonização e independência e principalmente pelo repatriamento dos antigos servidores, o ritmo do serviço era cada vez mais lento, pois a maior parte dos novos empregados estava em fase de aprendizagem, em condições de estágio; as divergências entre os movimentos de libertação [Movimento Popular de Libertação de Angola, MPLA, Frente Nacional de Libertação de Angola, FNLA, e União Nacional para a Independência Total de Angola, UNITA] faziam com que sistematicamente os serviços se retardassem; a avalanche de pedidos de documentação fez aumentar a quantidade de trabalho a realizar; as frequentes greves, em diversos sectores, mesmo no funcionalismo público, assim como a ocupação dos edifícios contribuíram também para que se notassem de dia a dia maiores dificuldades.
A aprovação dos livros a utilizar nas escolas movimentou sempre grandes influências, uma vez que desta atitude governativa dependiam elevados interesses materiais, dos quais provinham pingues lucros financeiros. Os estabelecimentos de ensino particular adoptavam também os que as autoridades escolhiam, quer porque se tratasse de compêndios de uso obrigatório, "livros únicos" ou então "livros oficialmente aprovados", quer porque os seus dirigentes viam vantagem em que os alunos seguissem os livros utilizados nas escolas oficiais, onde ou perante cujos professores prestariam provas de exame.
Embora fosse aberto concurso público entre os autores ou editores dos livros escolares, os interessados moviam influências que os favorecessem, procurando nos vogais uma brecha moral por onde escorresse a baba da venalidade. Verificava-se a aprovação quase sistemática de obras dos mesmos autores e publicadas pelas mesmas editoras.
No dia 21de Março de 1967, foi determinado que o prazo para a entrega, na Direcção-Geral do Ensino, dos livros, compêndios e cadernos auxiliares para apreciação, em ordem à sua adopção nas escolas, seria fixado em 15 de Maio do ano anterior ao concurso, isto é, em relação ao ano lectivo a iniciar em Setembro do ano seguinte. A apresentação tanto podia ser feita pelos autores como pelos editores; uns e outros tomariam o compromisso de editarem os trabalhos aprovados a tempo de estarem prontos ao começar a contar-se o prazo da validade. Esta medida foi tomada tendo em conta a sugestão apresentada no Conselho Coordenador das Actividades da Educação, do Ministério do Ultramar. Devemos ter presente que no ciclo preparatório, no ensino liceal e no ensino técnico, nas escolas dos territórios ultramarinos, eram quase sempre adoptados (por vezes com pequenas alterações) os livros aprovados pelo Ministério da Educação Nacional, ao qual competia elaborar também as provas de exame.
As exigências feitas e compromissos tomados raramente eram respeitados. Quase sempre no início do ano lectivo faltavam livros nas escolas ultramarinas, umas vezes por atraso da edição e outras vezes por deficiências na comercialização — a ainda outras por culpa da burocracia que também não respeitava prazos na apreciação e respectivos despachos.
Em 7 de Janeiro de 1971, foi regulamentado o comércio da venda de livros, sobretudo os escolares. Estabeleceram-se margens de lucro fixas, em relação aos preços praticados no mercado livreiro metropolitano. As obras que não fossem abrangidas pela designação de "escolares" ou "técnicas", poderiam ser vendidas com o aumento de vinte e cinco por cento sobre os preços de Portugal, enquanto aquelas não deveriam ser aumentadas em percentagens superiores a dez por cento sobre idênticos preços. Tinha-se em vista combater abusos e especulações.
As autoridades responsáveis fizeram publicar um decreto, com a data de 24 de Fevereiro de 1973, que regulava a forma da apreciação dos livros escolares a utilizar no ensino primário ou no ensino secundário, e destinados aos territórios ultramarinos; algum tempo antes, em data que não pudemos determinar, tinham sido tomadas medidas idênticas em relação ao ciclo preparatório.
Os livros do ensino primário, em Angola, deveriam ser escolhidos, dentre os aprovados, pela Inspecção Provincial de Educação; os do ensino secundário seriam seleccionados pelos conselhos escolares de cada estabelecimento, que para tal fim se reuniria antes de findarem as actividades do ano lectivo, para apreciarem e tomarem resoluções quanto às obras a adoptar no ano escolar imediato. A aprovação destes livros dependia da prévia apreciação feita pelo Gabinete de Estudos da Direcção-Geral de Educação, do Ministério do Ultramar, para um período de três anos, prorrogável por mais dois. Os livros e cadernos auxiliares eram aprovados em cada território ultramarino pelos seus Serviços de Educação, exceptuando Angola e Moçambique em que era pela Inspecção Provincial.
Quando eclodiu o movimento democrático de 25 de Abril, surgiram logo diversas tentativas de actualização dos compêndios escolares, em Angola. Foram editados alguns, destinados aos alunos das escolas primárias; devido ao facto de serem precipitadamente elaborados — porque houve a preocupação de agradar aos mentores políticos de momento, porque a evolução veio a mostrar-se muito diferente do que se previa, porque se verificou a intenção premeditada de aproveitar a maré, porque se fizeram correcções sem o estudo cuidadoso do que devia emendar-se e sem a cautela de evitar erros novos embora diferentes — verificou-se novo fracasso, tendo a registar mais esta manifestação de oportunismo e desonestidade intelectual, de corrupção mental.
Não queremos deixar de verberar com veemência a defesa histérica do que se chamou cultura angolana, a que muitos aderiram de forma duvidosa, tomando atitudes demagógicas, por vezes degradantes. Existe verdadeira cultura angolana, que alguns estudiosos de várias épocas, mas sobretudo do último século de dominação portuguesa, souberam apreciar e guardar com a pureza que foi possível conservar. Aceitemos que houve valores que não puderam manifestar-se, que o condicionalismo político contrariou; todos os condicionalismos políticos contrariam o que lhes não agrada nem favorece! Mas a quase totalidade daqueles que a partir de 25 de Abril de 1974, e sobretudo depois da proclamação de 27 de Julho desse ano, alinharam na defesa convulsiva da cultura angolense e se arvoraram em seus representantes e expoentes foram charlatães culturais, burlões mal intencionados, baldões da contestação que eles próprios desencadeavam.
Angola precisa de preservar a sua identidade cultural. Precisa de se incorporar no conjunto de povos civilizados. Carece de aproveitar os benefícios da técnica. Não poderá repudiar o que recebeu durante meio milhar de anos de contacto com o mundo europeu, através de Portugal. Só por esta via conseguirá percorrer vitoriosamente a longa etapa que o seu desenvolvimento exige ser vencida em curto prazo.
Pela portaria ministerial de 19 de Fevereiro de 1964, foram introduzidas diversas alterações ao decreto-lei de 28 de Maio de 1960, adaptando-o às condições dos territórios ultramarinos. As determinações de maior interesse podem ser assim escalonadas:
—Criou a classe preparatória do ensino primário, com vista
à divulgação e generalização prática,
entre as crianças que se aproximavam da idade escolar, do uso corrente
da língua portuguesa, nas relações sociais;
—Estabeleceu a frequência obrigatória da escola primária
até à aprovação no exame final, da quarta classe,
ou até perfazerem doze anos;
—Instituiu provas de passagem em todas as classes, no final do ano
lectivo, sendo submetidas a ela as crianças que os respectivos professores
reconhecessem estar preparadas para transitarem à classe imediata;
—Anunciou que iriam ser postos em vigor, logo que possível,
programas adaptados às condições locais, publicados
em anexo à portaria em questão;
—Determinou que certas disciplinas, como Língua Portuguesa,
Aritmética e Geometria, Ciências Geográfico-Naturais,
etc., a nomenclatura ou terminologia a adoptar seria apenas a dos programas
oficialmente aprovados, por despacho ministerial;
—Ordenou ainda que os livros de didácticos para uso dos professores,
oficialmente editados em Angola, e em utilização no ensino
rural, assim como os que foram aprovados por despachos de 9 de Maio de
1962 e 10 de Agosto de 1963, seriam considerados "livros únicos"
para o ensino primário em todas as províncias ultramarinas
portuguesas, sendo excluídos quaisquer outros.
O diploma a que temos feito referência foi publicado no
Boletim Oficial de Angola, no dia 7 de Março de 1964 e tinha anexo, como acima dissemos, o texto dos programas a que fazia menção.
Com a data de 17 de Abril de 1964, foi determinado que se aplicasse aos professores primários de Angola e de Moçambique o disposto no decreto-lei de 2 de Dezembro de 1960, segundo o qual tinham a possibilidade de repetir o "exame de estado", nas condições regulamentares, previstas nos diplomas em vigor. Houve quem, naturalmente, aproveitasse as facilidades oferecidas, conseguindo depois de alguns anos de actividade um lugar na escala de valorização muito superior ao primitivo; esta oportunidade permitiu que alguns docentes ascendessem a posições, no funcionalismo, que nunca tinham pensado atingir. A medida, pouco depois revogada, ficou com a fama de ter sido exageradamente individualista.
O decreto-lei de 10 de Setembro de 1964 promulgou a reforma do ensino primário elementar, a ministrar nos territórios ultramarinos sob administração portuguesa. Este documento dedica particular interesse às escolas de habilitação de professores de posto, iniciativa de Angola que mereceu a atenção das autoridades e se pensou transplantar para outros lugares. Apresentava-se como uma modalidade acertada de se conseguir pessoal com preparação literária e pedagógica satisfatória que poderia contribuir muito para resolver o grave problema da escolaridade nos locais longínquos; não se contava com número suficiente de professores formados nas escolas do magistério; na falta de uns e outros, lançou-se mão do recurso de treinar intensivamente monitores escolares, que careciam de preparação de base e, consequentemente, também de conhecimentos e prática didáctico-pedagógica.
As escolas de habilitação de professores de posto adoptariam, segundo os termos da reforma, os programas do ciclo preparatório, aprovados em 12 de Janeiro de 1952 e remodelados no decurso do ano civil de 1967, e a que foi dada a designação de ciclo unificado.
Em 25 de Outubro de 1965, foi estabelecida a constituição dos quadros docentes do ensino primário, em Angola. Por eles podemos constatar a expansão que nos anos anteriores tinha sido registada, apercebendo-nos pormenorizadamente da cobertura escolar primária. O papel pioneiro foi desempenhado pelos postos escolares, tendo à frente os regentes escolares, os professores de posto ou simples monitores escolares. A verdade e a justiça exigem que se lhes faça a merecida referência. Os dados disponíveis, contudo, não permitem dissecar melhor esta faceta da escolaridade angolana.
Por diploma de 4 de Dezembro do mesmo ano foi aumentado o pessoal colocado nos jardins-escolas, referindo-se expressamente aos de Benguela, Sá da Bandeira e Novo Redondo. Criaram-se três lugares de educadoras de infância, um em cada uma daquelas cidades, e sete lugares de monitoras de infância, quatro em Benguela e três em Sá da Bandeira. Não podendo afirmar-se que esta modalidade de ensino e assistência tenha merecido às autoridades o devido interesse e carinho, as breves referências que arquivamos constituirão apenas descoradas flores perdidas na vastidão e imensidade da estepa.
Na data de 31 de Agosto de 1968, foi autorizado o funcionamento das escolas infantis, nos períodos de férias, desde que as crianças fossem ocupadas apenas em actividades lúdicas e não em receberem lições de qualquer matéria escolar, mesmo abrangida pelas normas regulamentares. Apenas se permitia que fossem recebidas nestas condições as crianças de idade inferior a sete anos, salvaguardando o cumprimento da legislação vigente e os regulamentos aprovados. Tinha-se em conta a situação de muitos pais empregados nos seus ofícios e profissões, portanto, quase todo o dia ocupados e com dificuldade de encontrarem quem se encarregasse da vigilância dos seus filhos pequenos. O problema punha-se, evidentemente, quanto aos mais crescidos; no entanto, não podia descurar-se o cumprimento da lei, embora isso criasse problemas familiares e dificuldades pessoais bem compreensíveis.
O esquema da distribuição do tempo de férias e a organização das actividades circum-escolares não eram perfeitos; descuravam, como ainda hoje, a conveniência da educação, respeitavam princípios teóricos, dissociados da realidade. A vida não se compadece com teorias...
Em 26 de Fevereiro de 1970, foi criada em Luanda para funcionar no Bairro Prenda uma escola de crianças mentalmente diminuídas. Foi-lhe atribuído o nome de Escola António Aurélio da Costa Ferreira. Este nome homenageava um conhecido médico, antropólogo, psicologista e pedagogo português, que já em 1914 havia fundado em Lisboa o Instituto Médico-Pedagógico de Santa Isabel, destinado ao ensino de crianças atrasadas, sobretudo no aspecto mental. Afirmava-se que estava desde algum tempo em actividade, noutro local, em edifício que não reunia condições para funcionamento eficiente; agora dispunha de instalações próprias e de material didáctico adequado, de acordo com os mais modernos requisitos da pedagogia para este tipo de ensino e de crianças, e provido de corpo docente especializado. Um defeito se encontrou desde o primeiro momento, o de não poder comportar todas as crianças que careciam de pedagogia especial e que, numa escola como esta poderiam obter melhores resultados do que frequentando as classes e turmas com horário, programas e métodos de ensino normais.
Podem referir-se os sucessivos alargamentos do quadro docente, sobretudo do ensino primário, no decorrer da década que estamos analisando. Assim, em 28 de Janeiro de 1967, houve um aumento de duzentos lugares, cem de professores primários e cem de professores de posto. Três anos depois, em 3 de Fevereiro de 1970, registou-se novo aumento dos quadros: — quarenta professores primários, trinta mestres de ofícios, trinta e um auxiliares de ofícios e cinquenta professores de posto. Logo a seguir, em 13 de Março, verificou-se outro substancial alargamento dos quadros do ensino primário. Um decreto referendado (dez dias mais tarde) pelo presidente da República Portuguesa, Américo Tomás, aumentava nada menos de mil e quinhentos lugares de professor do ensino primário, que seriam preenchidos consoante as necessidades e orçamentados de acordo com as disponibilidades financeiras.
Passados outros três anos, em 14 de Setembro de 1973, foram criados oitocentos e cinquenta lugares de professor e novecentos e cinquenta lugares de professor de posto, aumentados ao número anterior.
Parece-nos ter certo interesse inserir o quadro da distribuição dos agentes do ensino, professores com o diploma das escolas do magistério primário e das escolas de habilitação de professores de posto. O respectivo
mapa apresenta a seguinte distribuição da cobertura docente, por distritos:
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Benguela |
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Bié |
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Cabinda |
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Cuanza-Norte |
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Cuanza-Sul |
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Cunene |
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Cuando-Cubango |
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Huambo |
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Huíla |
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Luanda |
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Lunda |
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Malanje |
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Mocâmedes |
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Moxico |
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Uíge |
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Zaire |
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SOMA |
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Em 24 de Maio de 1974, portanto já dentro do período da descolonização, foram criadas em Angola as categorias de professores primários agregados e professores de posto agregados, para o ensino primário, que seriam preenchidas por indivíduos legalmente habilitados. Admitiam-se também as categorias de professores eventuais, nos dois grupos, em que seriam aceites candidatos aos lugares que tivessem determinadas habilitações literárias, mas não o curso de habilitação para o magistério. Causa estranheza o interesse dedicado a uma terra e uma população que, sob outros pontos de vista, mais próximos e mediatos, não mereceu a devida atenção; não pode compreender-se uma determinação legal que só viria a realizar-se depois da já próxima independência e que as autoridades da ocasião só aceitariam se lhes conviesse!
Este diploma legislativo foi assinado em Luanda pelo único titular do antigo Ministério do Ultramar agora com a designação de Ministério da Coordenação Interterritorial, António de Almeida Santos.
Outro problema que mereceu a atenção das autoridades e foi em parte solucionado diz respeito ao pagamento de vencimentos do pessoal docente estranho aos quadros, os professores agregados e eventuais. Procurou-se corrigir o erro de lhes pagar os honorários com bastante atraso, o que representou um largo passo em frente na correcção de mazelas habituais. A determinação de pagar igual vencimento aos professores diplomados e aos que não tinham habilitações profissionais pode merecer observações pertinentes, pois o trabalho prestado era bem diferente; quase corresponde a pagar por igual a um técnico experimentado e a um aprendiz!
O decreto de 25 de Junho de 1975 fez a revisão dos vencimentos do pessoal docente do ensino primário, em Angola. Deu satisfação a velhas aspirações, aumentando o vencimento a auferir e subindo estes servidores públicos na escala do funcionalismo. A publicação deste diploma era a prova cabal de que até então se não tinha querido a sério resolver certos problemas, mantendo um sistema injusto e revoltante, que de algum modo contribuiu para o desprestígio e aviltamento da classe. Merecem ser fixados os nomes dos governantes que intervieram na elaboração do decreto e o subscreveram:
—Johnny Pinnock Eduardo, primeiro vogal do Colégio Presidencial;
—Lopo Fortunato Ferreira do Nascimento, membro do Colégio Presidencial;
—José N'Dele, também membro do Colégio Presidencial;
—Jerónimo Elavoco Wanga, titular do Ministério
da Educação e Cultura;
—Saydi Vieira Dias Mingas, do Ministério do Planeamento e Finanças;
—António da Silva Cardoso, ALTO-COMISSÁRIO
DE PORTUGAL EM ANGOLA.
Em 29 de Dezembro de 1967, foi mandado aplicar ao Ultramar português o disposto no decreto-lei de 9 de Julho de 1964. Este diploma ampliou o período de escolaridade primária obrigatória, ficando a abranger dois ciclos: — o elementar, até ao exame de quarta classe, e o complementar, de mais dois anos.
No dia 6 de Fevereiro de 1968, estendeu-se também aos territórios ultramarinos o que dispunha o decreto-lei de 23 de Setembro de 1966, pelo qual eram determinadas as matérias, por disciplina, a ensinar no Ciclo Complementar do Ensino Primário, e que eram:
—Língua Portuguesa;
—História de Portugal;
—Ciências Geográfico-Naturais;
—Matemática;
—Desenho e Trabalhos Manuais Educativos.
Além disso, havia ainda para os alunos deste grau de ensino ocupações respeitantes a "Educação Física", "Religião e Moral" e "Educação Musical", tendo actividades e trabalhos práticos nas tardes das quartas-feiras.
Apesar de o ciclo complementar nunca ter exercido papel influente em Angola, continuava a dedicar-se-lhe bastante atenção teórica. Assim, em 8 de Julho de 1968, foram aprovados para aplicação nos territórios transmarinos portugueses, a que foram tornados extensivos, os Programas do Ciclo Complementar do Ensino Primário, aprovados a título experimental, pelo Ministério da Educação Nacional, em 17 de Outubro do ano anterior. Em Angola, apenas se fizeram algumas experiências, tendo-se concluído que tal tipo de escolaridade não servia os interesses da população, pois não se enquadrava na estrutura dos anos seguintes, se o aluno decidisse prosseguir os estudos, não oferecendo outra vantagem que não fosse a consolidação dos conhecimentos anteriores e o alargamento da cultura. Os encarregados de educação têm sempre em vista finalidade prática, aplicação concreta e vantagem económica, objectivos que o ciclo não oferecia.
No dia 25 de Abril de 1969, foram aprovados para aplicação nas províncias ultramarinas os programas ensino primário elementar, então com o nome de Ciclo Elementar, constituído por cinco classes, as quatro já tradicionais acrescidas da classe preparatória. Foi revogada a portaria de 19 de Fevereiro de 1964, a que fizemos referência pormenorizada e de que este diploma pode considerar-se prolongamento e continuação. Dava-se prosseguimento aos programas aprovados em 16 de Julho de 1968 pelo Ministério da Educação Nacional, aplicando-os ao Ultramar com algumas alterações. A sua publicação no Boletim Oficial de Angola foi efectuada no dia 10 de Maio desse ano de 1969.
Um despacho do secretário provincial de 17 de Julho de 1969 fixou os modelos dos cadernos diários a usar nos estabelecimentos de ensino, em Angola, tanto oficiais como particulares ou oficializados (os das missões religiosas). Referimos o facto apenas como curiosidade. A medida carecia de interesse prático, pouco mais era do que uma bizantinice sem importância! A culpa maior não cabe aos mais altos responsáveis, mas aos funcionários do segundo escalão, que apresentavam a despacho os assuntos da sua carteira e aplicavam uma escala de preferências muito discutível, mesmo adulterada!
No dia 9 de Setembro de 1970, foi aprovado pelo governador-geral de Angola, Camilo Augusto de Miranda Rebocho Vaz, o Regulamento das Passagens de Classe e dos Exames do Ciclo Elementar do Ensino Primário, que em 26 de Agosto havia sido subscrito pelo inspector provincial, Dr. Sebastião António Morão Correia.
Com a data de 5 de Junho de 1973, foi tornada extensiva aos territórios ultramarinos sob dominação portuguesa, consequentemente também a Angola, a determinação conjunta do Ministério do Exército e do Ministério da Educação Nacional, de 24 de Março de 1955, segundo o qual os exames da quarta classe do ensino primário, efectuados nas escolas regimentais, teriam validade igual aos que eram prestados em escolas oficiais, desde que os respectivos júris tivessem a presença de um professor delegado da Direcção-Geral do Ensino Primário — no caso de Angola da Direcção Provincial dos Serviços de Educação. Tinha sido tomada medida idêntica em 27 de Outubro de 1952, em relação aos antigos exames da terceira classe.
Vem muito a propósito dizer que este decreto — o de 27 de Outubro de 1952 — foi o que impulsionou decididamente a escolaridade portuguesa obrigatória, mesmo no território europeu, que até então apresentara falhas inconcebíveis e defeitos insustentáveis. Com os muitos erros que comporta, alguns de suma gravidade, foi o ponto de partida para maior difusão cultural, que Portugal nunca tinha conseguido (em mais de um século de escolaridade obrigatória e gratuita) e que só nas décadas seguintes conseguiu realizar quase perfeitamente.
A organização das estruturas e a regulamentação dos serviços directivos tem importância fundamental para a consecução dos objectivos em mira. Pode dizer-se que os bons ou maus resultados dependem, em grande parte, da perfeição do funcionamento dos sectores, dos departamentos ou das repartições responsáveis; se não conseguirem a indispensável eficiência, os resultados não serão satisfatórios, mas se puderem realizar condições óptimas de funcionamento os frutos da sua actuação serão mais valiosos.
Uma grande parte dos defeitos que se podem assacar ao sector educativo proveio dos seus responsáveis, de qualquer grau. Houve excepções elogiosas, mas houve também erros lamentáveis e defeitos evidentes, que se reflectiram na forma de actuação de todo o sistema pedagógico. Encontraremos culpados entre funcionários de todas as categorias; os que têm responsabilidade oficial não estão isentos nesta acusação; mas encontra-se também quem os cometa estando fora e não tenha a menor responsabilidade... Não é raro encontrar os que se julgam salvadores inspirados, ungidos miríficos. Ao longo dos meses que durou o processo de descolonização, por exemplo, tornou-se evidente a incompetência dos responsáveis por quase todos os serviços e departamentos do Ministério da Educação e Cultura. Eram também notórios e inegáveis os erros cometidos por uns grupos de míticos e de místicos que actuavam sob a designação de Pró-Sindicato dos Professores e de Pró-Associação dos Estudantes... O que poderia esperar-se destes perturbadores do "render da guarda"?
Deixemos isso e voltemo-nos para as frias e sensaboronas referências históricas.
Um decreto-lei publicado com a data de 20 de julho de 1965 promulgou a orgânica dos serviços de inspecção pedagógica, isto é, as actividades de natureza cultural e docente dos territórios administrados por Portugal. Dando cumprimento ao que a lei dispunha, foram organizadas em Angola seis zonas de inspecção escolar, que abrangiam os seguintes distritos:
—1ª ZONA — Luanda, Cuanza-Norte e Cabinda; a sede estava na capital;
—2ª ZONA — Malanje, Uíge e Zaire; tinha sede na cidade
de Malanje;
—3ª ZONA — Benguela e Cuanza-Sul; estava sediada em Benguela;
—4ª ZONA — Huambo e Bié; tinha como centro a cidade de
Nova Lisboa;
—5ª ZONA — Moxico e Lunda; a sua sede estava na cidade de Luso;
—6ª ZONA — Huíla, Moçâmedes, Cuando-Cubango;
sede em Sá da Bandeira
Um diploma promulgado em 22 de Junho de 1966 regulou a situação dos professores primários que exercessem interinamente as respectivas funções em Angola e Moçambique, tendo ascendido ao cargo de directores ou subdirectores escolares, em comissão de serviço. Aceitou-se que poderiam ser nomeados pelo Ministério do Ultramar para ocuparem efectiva e definitivamente aqueles cargos, independentemente de concurso público, desde que à data da entrada em vigor do decreto de 23 de Dezembro de 1957, que criou os distritos escolares em substituição das antigas zonas escolares distritais, contassem pelo menos três anos de exercício consecutivo, no desempenho das referidas funções, tendo o serviço prestado obtido boas informações dos seus superiores hierárquicos. Poderiam também ser admitidos a concurso para subdirectores escolares, com dispensa do Curso de Ciências Pedagógicas, através de uma universidade, os professores primários que, em mais de três anos consecutivos tivessem exercido as funções de director ou subdirector escolar, em regime de interinidade.
Analisando o conteúdo destas disposições legais, e a sua aplicação em Angola, ficamos com a sensação de se tratar de medidas exageradamente individualizadas, atendendo casos concretos, bem definidos, coincidindo perfeitamente com as condições em que se encontravam determinados indivíduos, excluindo outros que se consideravam em posição idêntica. Pode dar-se, como exemplo, o caso de um professor que foi excluído por ter gozado a sua licença graciosa, pelo que se não contou o exercício como "tempo ininterrupto". Este caso tornou-se o exemplo típico da falta de equidade e de medida tomada "sob medida"!
Em 17 de Agosto de 1966, era aprovado novo Regulamento dos Concursos para Inspectores e Subinspectores Escolares das Províncias Ultramarinas. Estava previsto no mencionado decreto de 20 de Julho de 1965, que tratou da orgânica dos serviços de inspecção pedagógica.
No dia 27 de Maio de 1967, os distritos escolares de Bié, Uíge e Malanje passaram a ser considerados como de primeira classe, atendendo a que se tinha registado sensível aumento dos quadros docentes e da população discente, no ensino primário. Os distritos escolares de Cabinda, Zaire, Lunda, Moxico e Cuando-Cubango ascendiam à categoria de distritos de segunda classe, pelo mesmo motivo. Ainda dentro das informações do tipo que acabamos de prestar, podemos dizer que, no dia 7 de Abril de 1971, foi criada a Repartição Escolar Distrital do Cunene; procurava dotar-se o mais recente distrito angolano com os serviços burocráticos que normalmente se encontravam nos outros, de criação mais antiga. Cruzando informações diversas, chega-se à conclusão de que a situação da ensinança era aqui verdadeiramente incipiente, não existindo senão poucas e pequenas escolas do ensino primário e nenhuma de grau mais adiantado.
Verificou-se a necessidade de alargar os quadros do pessoal afecto à inspecção pedagógica, que se reconhecia ser insuficiente. Para de certo modo resolver problemas (e também para dar satisfação a aspirações pessoais, manifestadas através de influências de vários tipos), alguns professores primários foram colocados, em comissão de serviço, como subinspectores, quase sempre nas localidades menos cobiçadas. Atendendo ao condicionalismo, em 1 de Outubro de 1969 foi aprovado outro Regulamento do Conselho de Inspectores Escolares, cujo conteúdo não merece maior referência, por ser destituído de interesse para o estudo da evolução escolar angolana. Algum tempo depois, no dia 1 de Setembro de 1972, era aprovado novo Regulamento dos Concursos para Subinspectores Escolares, estabelecendo-se que os candidatos seriam agrupados deste modo:
—GRUPO A — Os que tivessem o curso das escolas do magistério primário, o curso de ciências pedagógicas e a qualificação de todo o seu tempo de serviço como Suficiente;
—GRUPO B — Os que tivessem o curso das escolas do magistério primário, e três anos de serviço com a qualificação de Suficiente, dois dos quais em exercício no Ultramar.
Pode pensar-se que também este diploma se apresenta com características individualizadas, uma adaptação a casos bem concretos. Este pensamento consolida-se ao verificar que teve limitada divulgação. As provas a prestar, analisadas pelos programas publicados, incidiriam sobre temas definidos, alguns de baixa exigência e outros extremamente vagos e imprecisos, com tendências memorializantes. A sua enumeração era a constante do esquema seguinte:
—Biologia Educacional;
—Noções Gerais de Antropologia Cultural e de Política
Social;
—Princípios Gerais de Direito e Noções de Administração
Ultramarina;
—Administração Escolar.
Em 18 de Dezembro de 1963, o Governo de Lisboa autorizou os governadores-gerais de Angola e Moçambique a organizarem um quadro único, em cada território, de pessoal técnico, vigilância, assistência e ensino para estabelecimentos prisionais e internatos de menores sujeitos à tutela do Estado, elaborando o orçamento necessário para que pudesse funcionar e desenvolver a actividade prevista. A forma de recrutamento deste pessoal, as suas atribuições específicas e a competência que a cada um seria atribuída deveria cada um dos governadores estabelecê-la, em portaria a promulgar quando se julgasse oportuno. Dedicava-se, pois, algum interesse aos detidos e educandos recolhidos em centros de regeneração, admitindo que a reabilitação é trabalho essencialmente educativo, baseado em comportamento humanitário e atitudes compreensivas. Estas condições nem sempre são facilitadas aos que o rigor das leis atiram para a sombra dos cárceres, transformados muitas vezes em escola de criminosos!
No dia 21 de Setembro de 1967, foi criada a Comissão de Exame e Classificação de Espectáculos, constituída pelo seu presidente e seis vogais, sendo revogada a portaria de 22 de Agosto de 1962. Referiam-se ao mesmo assunto os diplomas de 7 de Junho de 1961 e de 26 de Novembro de 1958, tendo sido alterado o número de membros daquela comissão. O valor formativo, educativo e cultural dos espectáculos era reconhecido pelas autoridades, que procuravam orientá-lo. A censura é detestável e não deveria nunca travar a capacidade artística e os dotes criativos; mas acontece que por vezes se pratica liberdade desenfreada, que apresenta como arte o que não passa de grosseria, carência de senso a roçar pela boçalidade! Os espectáculos artísticos têm a finalidade de divertir, mas ao mesmo tempo educar mental, intelectual e estéticamente os que a eles assistem. Devemos lamentar que sejam, com muita frequência, elementos de degradação e de aviltamento, abusando da nobreza de sentimentos a que a liberdade deve sempre atender!
Um despacho do governador-geral de Angola, de 21 de Outubro de 1965, admitia que muitas vezes eram admitidos como professores indivíduos sem preparação intelectual suficiente, chegando a verificar-se nalguns casos que os encarregados de ensinar, em certos lugares mais remotos, nem sequer tinham feito o exame do ensino primário elementar. Este estado de coisas provinha, em muitos casos, da necessidade de fazer rápida cobertura pedagógica. As escolas regidas por tais elementos não eram reconhecidas pelas autoridades e o ensino ministrado (dizia-se), além de desvirtuado, provocava por vezes o desprestígio dos Serviços de Educação, que o não sancionava mas sofria um descrédito que não era directamente da sua responsabilidade. Por isso, foi determinantemente proibido, daí em diante, o funcionamento dessas escolas; para funcionar, qualquer estabelecimento de ensino carecia de autorização escrita, de documento emanado dos Serviços de Educação, quer isso se verificasse no ensino oficial, oficializado, particular ou individual. Recomendava-se que se procurasse identificar as escolas em actividade clandestina e aconselhava-se que só fossem reconhecidos os agentes de ensino que mostrassem garantir um mínimo de eficiência, baseado na competência e habilitações literárias.
Vem a propósito dizer que já nos começos do século XX se afirmava ser muito ineficiente o ensino ministrado nas escolas de Angola. O autor dessa afirmação adiantava ainda que o melhor ensino era ministrado pelos naturais, ensinando-se uns aos outros... Esta posição deveria ser extremista e exagerada, mas baseava-se na observação real. Quanto ao período de que estamos tratando, o terceiro quartel do século, era certo que muitas crianças aprendiam em escolas clandestinas; eram mantidas, em regra, por indivíduos com pouca preparação; eram facilmente localizadas, havendo-as na própria capital do país, apontadas por tabuletas sinalizadoras, reconhecíveis pelo ruído característico de qualquer classe; as próprias autoridades, inclusive os inspectores, que percorriam a cidade, não deixavam de ver o que todos viam e o que os interessados queriam que fosse visto; se não tomavam medidas adequadas, deixavam de cumprir os seus deveres. Até as crianças matriculadas em escolas oficiais se aproveitavam delas como "salas de estudo" para preparação das lições. Um pormenor deve ser salientado:— em regra, estes alunos faziam letra melhor desenhada do que os que eram ensinados nas escolas públicas.
O que acaba de referir-se é, em boa parte, confirmado pelo despacho do secretário provincial, Dr. José Pinheiro da Silva, subscrito em 27 de Maio de 1970, que regulou a forma de recrutamento do pessoal eventual do ensino secundário; pela sua extensão, pode ser considerado quase como um verdadeiro regulamento.
O decreto-lei de 17 de Fevereiro de 1969, assinado pelos dois ministros, o da Educação Nacional e o do Ultramar, regulou a prestação do estágio para formação pedagógica dos professores do 1º e 9º grupos do ensino liceal e do 1º e 11º grupos do ensino técnico. O estágio pedagógico veio a ser regulamentado algum tempo depois pelo decreto-lei de 4 de Julho seguinte; e a portaria do dia 28 do mesmo mês e ano designou para isso a Escola Industrial e Comercial Sarmento Rodrigues, em Nova Lisboa, a Escola Industrial e Comercial Artur de Paiva, de Sá da Bandeira, e o Liceu Salvador Correia, de Luanda, elevando-os à categoria de Escolas Normais.
Os estágios pedagógicos mostravam-se de ineficiência quase completa, forma arcaica de criar grupos elitistas, impedindo o arejamento dos corpos docentes. Na falta de pessoal com habilitações completas, o ensino estava em grande parte entregue a professores eventuais. O estágio se não arredava do ensino, dificultava a radicação nele, e exactamente dos mais preparados. Pela lógica, deveriam ser aqueles a receber orientação didáctico-pedagógica, pois eram os que mais careciam dela.
Está nesta linha de pensamento o despacho do Dr. José Pinheiro da Silva, de 28 de Maio de 1969 (reforçado pelo de 27-V-70, acima referido), tomando a iniciativa de regular a forma de recrutamento do pessoal docente; reconhecia-se a tendência geral de admitir elementos mal preparados, em manifesto prejuízo dos alunos e desprestígio das instituições.
A análise das verbas gastas com qualquer actividade ou sector
pode ajudar-nos a avaliar o maior ou menor interesse que ele mereceu aos
responsáveis, ao mesmo tempo que nos ajuda a compreender também
o processo evolutivo verificado. Apenas por isso, vamos dedicar algum espaço
aos quantitativos fiduciários empregados em escolas e no seu equipamento.
Segundo informação com data de 18 de Fevereiro de 1967, os
fundos permanentes afectos a alguns departamentos escolares dependentes
dos Serviços de Educação eram estes:
Escola Industrial de Luanda |
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Escola Industrial e Comercial de Sá da Bandeira |
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Escola Industrial e Comercial do Lobito |
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Escola Industrial e Comercial de Nova Lisboa |
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Escola Comercial de Luanda |
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Liceu de Nova Lisboa |
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Escola Agro-Pecuária de Tchivinguiro |
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No dia 8 de Abril de 1967, foi aprovado o orçamento do Fundo Escolar de Angola, para o ano civil decorrente, o qual atingiu o montante de sete mil duzentos e cinquenta e quatro contos.
No dia 6 de Janeiro de 1969, foi aprovado o orçamento do mesmo organismo e sabemos que se elevava a sete mil quinhentos e cinquenta e quatro contos, portanto, com o aumento insignificante de trezentos contos em relação a dois anos antes. Neste momento eram membros da comissão administrativa os seguintes indivíduos:
—Armindo José da Cruz Gonçalves;
—Domingos Castelo Crespo;
—Lazarino Clemente dos Mártires Poulson.
Na data de 7 de Janeiro desse ano de 1969, foi distribuída a verba para o funcionamento das escolas de artes e ofícios, que era de quatro mil contos; destinava-se ao pagamento dos vencimentos e gratificações do pessoal assalariado, a novas construções e à aquisição de material de uso permanente. Em 5 de Março, atribuía-se-lhes nova verba, esta de quatro mil e oitocentos contos.
O orçamento do Fundo Escolar de Angola para 1972 atingiu a importância de oito mil quinhentos e cinquenta e três contos, contando apenas o basilar, isto é, pondo de parte o reforço de verbas, os créditos especiais e orçamentos suplementares, se os houve.
O mapa da distribuição de verbas às escolas, elaborado e aprovado em 11 de Dezembro de 1973, atingiu a quantia de vinte e um mil contos, incluída no orçamento sob a rubrica: — Aquisições de utilização permanente — Móveis.
Outro mapa de distribuição de dinheiros públicos, sob igual denominação, subscrito em 13 de Janeiro de 1975, portanto já em pleno período de descolonização, atingiu o quantitativo de vinte e nove mil e quinhentos contos.
Um despacho do dia 9 de Junho deste mesmo ano, publicado em 18 desse mês, aprovou o mapa da despesa com a Aquisição, conserto e lavagem de roupa, em diversos departamentos, organismos e estabelecimentos dependentes do Ministério da Educação e Cultura, que se elevava a meio milhar de contos. Não temos conhecimento de que, anteriormente, tenha alguma vez sido orçamentada verba para tal fim.
O mapa dos quantitativos destinados ao pagamento dos tempos lectivos extraordinários, aos professores de diversos estabelecimentos de ensino, de grau superior ao primário, aprovado em 31 de Janeiro de 1975, atingia vinte e três mil contos. Pouco depois, em 22 de Maio seguinte, era subscrita nova verba para o mesmo fim, da importância de setenta mil contos.
Terminamos esta fria e sensaborona enumeração que não teve outra finalidade que não fosse ajudar-nos a perceber a evolução do processo educativo, como reflexo do interesse ou falta de interesse que mereceu às autoridades. A comparação taxativa dos números poderá deixar uma imagem deformada, pois diversos factores influíram na sua determinação. Devem ser vistos como elemento de estudo e confronto e não como dados de valor absoluto; dependeram do condicionalismo social e político, pelo menos tanto como da evolução e progresso didáctico-pedagógico.
Um despacho subscrito pelo governador-geral de Angola, Silvino Silvério Marques, em 17 de Abril de 1965, regulou a forma de colaboração a prestar pela Junta Provincial de Povoamento na solução de alguns importantes problemas relacionados com a assistência a prestar às populações rurais em idade escolar, cooperando com a Direcção Provincial dos Serviços de Educação. Uma das obrigações que impendia sobre aquele organismo consistia em contribuir, na medida das suas possibilidades e disponibilidades financeiras, técnicas e humanas para a construção de edifícios escolares e residência dos agentes do ensino, nos meios rurais. Tendo em consideração que o crescimento da população escolar angolana era extraordinário e exigia a adopção de medidas adequadas e de concretização tão rápida quanto possível, em 18 de Janeiro de 1974 foi nomeada a Comissão Coordenadora das Construções Escolares, que ficou com a seguinte constituição:
—Director dos Serviços de Obras Públicas e Transportes,
seu presidente;
—Director dos Serviços de Educação, vice-presidente;
—Dois elementos técnicos da Direcção dos Serviços
de Obras Públicas e Transportes;
—Dois elementos ligados à Secretaria Provincial de Educação.
Segundo o diploma, poderia ainda ser pedida a colaboração da Câmara Municipal de Luanda, do Laboratório de Engenharia de Angola, do Conselho Provincial de Obras Públicas e Comunicações, e do Conselho Provincial de Educação Física, sempre que se reconhecesse vantagem ou necessidade de ouvir as suas sugestões, manifestadas por meio de informações prestadas às questões que lhes fossem apresentadas para apreciação.
O Boletim Oficial de Angola, de 31 de Janeiro de 1972, publicou uma portaria subscrita em 25 desse mês pela qual era aprovado o Regulamento do Prémio Rui de Sousa. Destinava-se a galardoar dois alunos, um de cada sexo, das escolas primárias dos concelhos de Vila do Bispo, em Portugal, e de Santo António do Zaire, em Angola. Era instituído pela companhia aérea T.A.P. , Transportes Aéreos Portugueses, e consistia em viagens de intercâmbio entre os dois territórios. As crianças a quem fossem concedidos os prémios seriam acompanhadas por pessoas de família, às quais eram concedidas também deslocação e estadia gratuitas. A determinação das localidades indicadas para a selecção dos beneficiários explica-se por ter sido em Sagres, local histórico situado naquele concelho, que se preparou o início da campanha dos Descobrimentos, e por se haver efectuado na proximidade daquela vila angolana o primeiro desembarque dos portugueses.
As actividades circum-escolares estão ligadas aos trabalhos docentes e discentes por estreitos laços, mantendo com eles certa dependência e similitude. Revestem-se de particular interesse e todos os pedagogos reconhecem a vantagem de as incentivar; nalguns casos chegam a substituir com vantagem as próprias tarefas de estudo. Em regra, as crianças e adolescentes gostam de as praticar e mais ainda quando lhes estiver ligado algum atractivo particular. Podemos pensar nas actividades desportivas ligadas aos trabalhos da educação física e aos ensaios de canto se no reportório foram incluídas músicas em voga.
Em 3 de Janeiro de 1966, foi mandado aplicar em Angola e Moçambique o Regulamento dos Cursos de Instrutores de Educação Física, aprovado em 4 de Setembro de 1964, tendo-lhe sido introduzidas algumas alterações. Seria ministrado este curso em quatro semestres, abrangendo disciplinas teóricas e também actividades relacionadas com a prática dos desportos individuais e havia estudos sobre matérias afins. Eram focadas, com maior ou menor profundidade, os seguintes tópicos:
—Teoria da Ginástica;
—Psicopedagogia;
—Jogos e Desportos;
—Biologia Aplicada à Educação Física;
—História da Educação Física;
—Higiene e Primeiros Socorros;
—Deontologia;
—Teoria do Treino;
—Organizações de Juventude;
—Atletismo;
—Natação;
—Andebol;
—Basquetebol;
—Futebol;
—Voleibol;
—Campismo;
—Danças Folclóricas;
—Canto Coral;
—Jogos Educativos.
As actividades de educação física escolar nunca conseguiram vencer a natural inércia, mais por culpa das autoridades do que dos professores e alunos, sobretudo na escola primária. Salvo algumas poucas excepções, o interesse que se lhes dedicava era diminuto e a preparação deficiente; procurava-se encher o tempo com o mais fácil e talvez mais agradável, uma bola entregue aos alunos permitia ao instrutor fingir que cumpria a sua função sem qualquer esforço... As famílias preocupavam-se pouco com esta faceta educativa, não viam nela o seu verdadeiro interesse e nem nos responsáveis o papel que poderiam desempenhar se cumprissem com escrúpulo os deveres a que se comprometeram.
No dia 14 de Fevereiro de 1968, foi aprovado e posto em execução, a título experimental, o Programa de Canto Coral para o Ensino Secundário, subscrito pelo comissário provincial da Mocidade Portuguesa, Fernando Augusto Simões Alberto, que abrangia cinco anos de escolaridade. Aplica-se aqui, em boa parte, o que dissemos da educação física, das actividades gimnodesportivas. O interesse dos responsáveis não seria grande, os alunos desinteressavam-se também, as famílias não viam nesta actividade a sua grande importância, as estruturas escolares não impulsionavam a sua preponderância; não se reconhecia quanto vale para a formação cultural, estética e até cívica dos cidadãos; numa palavra, tudo contribuía para que a divina arte dos sons baixasse de nível e se desprestigiasse. Acrescente-se que a moderna facilidade da audição da música, em vez de ajudar a construir a cultura musical, contribui poderosamente para que se não desenvolva.
Na data de 26 de Junho de 1971, era criado em Luanda o Laboratório de Línguas, que deveria servir de piloto para outras iniciativas deste género, segundo o que estava previsto no diploma da sua instituição. Ficaria dependente da Direcção Provincial dos Serviços de Educação e tinha a finalidade de:
—Auxiliar os professores a aperfeiçoarem os seus conhecimentos
e prática falada das línguas vivas;
—Promover cursos de preparação e aperfeiçoamento,
e também outros especialmente votados ao emprego, no ensino, dos
meios modernos, utilizando técnicas audio-visuais;
—Organizar séries de lições, destinadas a estudantes
e outras pessoas interessadas na aprendizagem de línguas estrangeiras,
ministradas em cursos sistematizados.
No dia 8 de Julho de 1970, um decreto promulgado no dia 23 seguinte pelo presidente da República Portuguesa, Américo Deus Rodrigues Tomás, aumentava ao quadro dos funcionários dos Serviços de Educação de Angola [declarando-se que seria alargado o que se publicara como anexo ao decreto de 8 de Novembro de 1969], os seguintes elementos directivos:
—Um lugar de adjunto do director provincial;
—Cinco lugares de inspector-adjunto;
—Dez lugares de inspector escolar;
—Catorze lugares de subinspector escolar;
—Um lugar de chefe de secretaria.
Em 12 de Janeiro de 1971, foram aumentados lugares orientadores nos Serviços de Educação, com o objectivo de serem preenchidos lugares em departamentos ainda não providos, criando os de:
—Um de director escolar;
—Um de subdirector escolar;
—Um de inspector escolar;
—Dois de subinspector escolar.
Já ao aproximar-se a data da proclamação da independência, em 19 de Julho de 1974, o governador-geral Silvino Silvério Marques, pela segunda vez no cargo durante curto tempo, aumentou os quadros directivos da Direcção Provincial dos Serviços de Educação de Angola [sendo determinada, no dia 27 seguinte, a forma de provimento e sua distribuição pelos diversos distritos e estabelecimentos], com as seguintes unidades:
—Vinte e três chefes de secção;
—Vinte e cinco primeiros-oficiais;
—Trinta segundos-oficiais;
—Vinte terceiros-oficiais;
—Vinte escriturários-dactilógrafos de primeira classe;
—Trinta escriturários-dactilógrafos de segunda classe;
—Cinquenta contínuos contratados;
—Duzentos contínuos auxiliares de primeira classe;
—Duzentos contínuos auxiliares de segunda classe.
Em 14 de Abril de 1975, foram criados ainda os lugares de:
—Director-geral dos Serviços de Educação e Cultura,
que acumularia as funções com as de inspector do ensino;
—Director-geral do Ensino Superior;
—Director-adjunto do Ensino Superior;
—Director-geral do Ensino Preparatório e Secundário;
—Director-adjunto do Ensino Preparatório e Secundário;
—Director-geral da Educação Física e Desportos;
—Director-adjunto da Educação Física e Desportos;
—Director-geral do Ensino Primário;
—Director-geral da Alfabetização e Educação
Permanente;
—Director-geral da Acção Social Escolar;
—Director-geral da Cultura;
—Chefe da Repartição Central dos Serviços Administrativos;
—Chefe da Divisão do Pessoal Administrativo;
—Chefe do Gabinete de Construções Escolares;
—Chefe do Gabinete de Relações Públicas;
—Oito conselheiros técnicos;
—Sete secretárias.
Os problemas da saúde mereceram algum interesse aos responsáveis. Não foi possível, atendendo a condicionalismos e dificuldades, realizar a obra que poderia ter sido efectuada, ficando-se quase sempre nos bons desejos e aspirações. Não foram estabelecidos planos de acção perduráveis, abandonando uma experiência para passar a outra. Perdeu-se tempo precioso e mantinha-se em serviço pessoal que não produzia o que podia e devia produzir. Fez-se dispêndio de dinheiro e perdeu-se ingloriamente o trabalho de organização relativo a diversas experiências e iniciativas. No entanto, temos de reconhecer que ainda houve elementos médicos e de enfermagem dedicados ao serviço e à função, fazendo tanto quanto lhes era possível para prestar a possível e a melhor assistência. Fizeram-se tentativas várias da estruturação da assistência médica e medicamentosa aos alunos das escolas oficiais. Em 27 de Agosto de 1965, foi aprovado o Regulamento do Serviço de Saúde Escolar do Ultramar, que está na base de muitas iniciativas futuras. Algum tempo antes, no dia 2 de Maio de 1964, tinham sido fixadas as remunerações apagar aos enfermeiros designados para professores do Curso de Agentes Sanitários de Assistência Rural, assim como aos professores e monitores que nele prestassem serviço.
No dia 27 de Julho de 1967, eram criados os centros regionais de medicina desportiva, em Benguela, Lobito, Moçâmedes, Nova Lisboa e Sá da Bandeira. Seriam constituídos por um médico, um enfermeiro e um escriturário. Na mesma data, foi publicado o Regulamento dos Serviços Médico-Desportivos dos Centros Regionais de Medicina Desportiva de Angola, subscrito pelo presidente do Conselho Provincial de Educação Física, organismo dependente da Secretaria Provincial de Educação. Este cargo teve, na prática, um único ocupante, Daniel Rogério Leite.
Com a data de 17 de Agosto de 1971 foi tornada obrigatória a vacinação antitetânica dos alunos de todos os estabelecimentos de ensino, tanto oficiais como particulares. Verificava-se a necessidade de colaborar desta forma na defesa da saúde pública, que se via ameaçada.
Finalmente, em 13 de Maio de 1975, portanto já bem perto da proclamação
da independência de Angola, foram criados no Ministério da
Educação e Cultura os Serviços de Acção
Social, que englobavam outros anteriormente organizados e lhes davam
não só continuidade como amplitude e extensão.
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