54. DENOMINAÇÃO DAS ESCOLAS

Atribuir nomes, quer às pessoas quer às coisas, poderá considerar-se como que uma tendência natural. Temos palavras e expressões para designar todos os seres da escala zoológica e da gradação botânica; até na mineralogia e nos espaços cósmicos aplicamos nomes que facilitem o entendimento e a compreensão das referências. A aplicação de nomes vai ainda mais além, entra nos domínios alheios ao mundo material e nem sequer se detém na fronteira das regiões supranaturais. Não admira, portanto, que para as instituições políticas, sociais e culturais o homem invente designações e as aplique como forma de homenagem e consagração colectiva.

Atribuir nomes é uma ciência e uma arte. Para os antigos, o nome tinha como que valor carismático — aliás aceita-se que surgiram como forma de salientar facetas físicas ou morais, qualidades e defeitos. As alcunhas têm ainda algo parecido.

O estudo de nomes que hoje parece não terem qualquer significado demonstra que foram arrancados ao vocabulário comum da época e traduziam ideias bem claras. A longa série dos nossos apelidos e sobrenomes corresponde a uma lista de vocábulos de uso corrente. São muitos os nomes que denotam origem religiosa.

Nem sempre os nomes são aplicados com o senso recomendável; algumas vezes até denotam falta do sentido da objectividade.

Os nomes atribuídos às escolas de Angola [os dos seus patronos] nem sempre foram bem aplicados. Cometeram-se erros que poderiam ter sido evitados. Desejando prestar homenagem a determinadas figuras, por vezes escorregou-se no descrédito, devido a não traduzirem a grandeza que se julgou possuírem.

Relativamente aos patronos das escolas angolanas, não faremos distinção entre os perfeitamente ou menos bem escolhidos. Num estudo como este, não seria aceitável tal atitude.

Apenas como exemplo, referimos que o mais antigo titular de um estabelecimento de ensino, entre muitas dezenas deles, mencionados no livro Patronos das Escolas de Angola, Rita Norton de Matos, era uma adolescente quando o seu nome foi dado a uma escola do território. Quis lisonjear-se o governador, seu pai, através da esposa, que transferiu a honra para a filha do casal.

Cometeram-se erros e prometem continuar. Apenas se iniciou o processo de descolonização e independência, muitos nomes bem ou mal escolhidos foram substituídos por outros, tão imperfeitamente escolhidos como os primeiros. Mas isso está fora do plano de trabalho elaborado, portanto não lhes faremos referência crítica nem menção elogiosa.

Recordamos aqui o que se escreveu ao falar das escolas primárias. O que dissemos, em grande parte transcrito de documentos oficiais, tem aplicação plena e válida. Sem nos repetirmos, entende-se conveniente transcrever textualmente a portaria de 9 de Abril de 1966, pois trata deste assunto e exprime doutrina que deveria ter sido sempre considerada e algumas vezes se olvidou. Diz assim:

A designação de patronos para obras de vulto, com o objectivo de se prestar condigna e duradoira homenagem a individualidades cuja vida de trabalho estrénuo e de abnegado sacrifício em prol do engrandecimento da Nação foi exemplo para contemporâneos e vindouros, constitui princípio salutar e eminentemente patriótico, já consagrado por longa tradição em todas as parcelas do território nacional. No decurso do presente ano, a Província assistirá à inauguração de diversos empreendimentos que pela sua importância se enquadram no conjunto das realizações merecedoras de atribuição de um patrono, convindo por isso que se definam normas para a sua designação. Nestes termos, com o parecer favorável do Conselho Económico e Social (...), o governador-geral de Angola manda:

A designação dos nomes de patronos a dar a "obras", tais como edifícios, pontes, barragens e outras similares, constituirá objecto de despacho específico do governador-geral, sobre proposta justificada dos Serviços interessados;

A escolha desses patronos visará, em regra, prestar homenagem a personalidades já falecidas.

Em teoria, estava certo; na prática, as coisas passaram-se de maneira muito diferente, sobretudo em relação a individualidades do meio social ainda vivas.

No dia 15 de Maio de 1967, foram dados como patronos:

Oliveira Salazar —Liceu de Carmona, Uíge;
Peixoto Correia —Liceu de Benguela;
Silva Cunha —Liceu de Silva Porto.

Em 25 de Maio de 1968, atribuíram-se patronos a grande número de escolas. Os então designados foram:

—Silvério Marques;
—Tomás Berberan;
—Sá Viana Rebelo;
—Ernesto Vilhena;
—Óscar Carmona;
—Silva Freire;
—Lopes de Sequeira;
—Silva Carvalho;
—D. Moisés Alves de Pinho;
—Oliveira Salazar;
—D. António Barroso;
—Vasco da Gama;
—Gago Coutinho;
—Venâncio Deslandes;
—D. João II;
—Armindo Monteiro;
—Paiva Couceiro;
—João de Almeida;
—Sousa Dias;
—António de Almeida;
—Trigo de Morais;
—Bartolomeu Dias.

Segundo o diploma oficial, procuraram-se figuras que pudessem dignamente representar e inspirar a obra de formação de um escol de futuros técnicos. Atendo-nos ainda aos termos da portaria, referiremos que ela salientava representarem tais patronos estímulo, sacrifício e dedicação, podendo ser apontados à juventude como exemplo a seguir, e por isso surgira a ideia de os escolher para patronos dos estabelecimentos de ensino de Angola, destinados à preparação profissional das novas gerações, prestando-se-lhes ao mesmo tempo a homenagem a que tinham direito.

Em 19 de Julho de 1968, um notável personagem da História de Portugal e da História de Angola, que pelos seus feitos se tornou digno de admiração e gratidão, encontrando-se no escol dos grandes obreiros, pois foi fundador da cidade de Nova Lisboa (...) e deve ser apontado como exemplo aos jovens, pelo estímulo, sacrifício e dedicação, que bem representa, tornou-se patrono do liceu daquela cidade, que passou a designar-se:

—Liceu Nacional de Norton de Matos.

No dia 28 de Setembro de 1968, foram criadas escolas de habilitação de professores de posto em Luanda, Cabinda e Benguela. Ao mesmo tempo foram escolhidos os seus titulares e ainda os de outras escolas antes criadas. Por isso, foram elevados à categoria de patronos as figuras de:

—Tomás Vieira da Cruz;
—João Tiroa;
—Maria Amália Vaz de Carvalho;
—P. António Vieira;
—Rainha Santa Isabel;
—D. António Ildefonso;
—D. Maria II;
—Rainha D. Amélia;
—Rainha D. Leonor;
—D. Manuel Gonçalves Cerejeira;
—Rebocho Vaz;
—Hortênsio de Sousa.

Em 9 de Setembro do mesmo ano, foram atribuídos patronos às escolas preparatórias de numerosas localidades, que foram estes:

—Duarte Teixeira;
—Cerveira Pereira;
—Barão de Puna (Barão de Cabinda);
—Francisco de Sousa Coutinho;
—Carmona;
—Trindade Coelho;
—Pedro César de Meneses;
—Trigo de Morais;
—Agostinho de Campos;
—Sousa Dias;
—Lopes Sequeira;
—Henrique de Carvalho;
—D. Afonso Henriques;
—D. João I;
—Emídio Navarro;
—João Crisóstomo;
—Marta do Resgate Salazar;
—D. Luísa de Gusmão;
—Óscar Ribas;
—Gonçalves Crespo;
—Marquês de Pombal;
—Armindo Monteiro;
—Barão de Moçâmedes;
—Silva Freire;
—Luís de Camões;
—Sousa Gentil;
—Sacadura Cabral;
—Bartolomeu Dias;
—Augusto de Castilho;
—Pinheiro Chagas;
—Robert Williams;
—Marquês de Sá da Bandeira;
—Salazar;
—Silva Carvalho;
—Serpa Pinto;
—Silva Porto;
—Paiva Couceiro;
—D. Moisés Alves de Pinho.

No dia 26 de Dezembro do mesmo ano de 1968, foram atribuídos patronos às quatro escolas do magistério primário que existiam em Angola, pessoas ilustres que pelas suas raras virtudes possam ser apontadas às novas gerações como exemplo digno de ser seguido, na expressão do diploma oficial. As figuras escolhidas neste caso foram:

—P. Carlos Estermann;
—Jaime Moniz;
—Luís Gomes Sambo;
—João de Deus.

No dia 6 de Maio de 1969, foi atribuído um nome ao Jardim-Escola de Benguela; no entanto, podemos referir que já alguns anos antes se lhe dava o mesmo nome, mesmo em publicações oficializadas, como a Revista do Ensino, que o inseria em 1957, portanto uma dúzia de anos antes daquela data. Também devemos notar que nas listas anteriores há nomes repetidos, isto é, foram dados a mais de uma escola. No caso, tratava-se da esposa do presidente Craveiro Lopes — D. Berta Craveiro Lopes.

Em 20 de Agosto desse ano de 1969, foram atribuídos patronos a duas escolas de habilitação de professores, os prelados católicos:

—D. Altino Ribeiro Santana;
—D. Manuel António Pires.

Devemos referir que quase sempre estas escolas foram instituídas por iniciativa de entidades católicas; por isso todos ou quase todos os seus patronos são figuras preponderantes da Igreja. E aproveitamos para dizer que, em 6 de Janeiro de 1971 foram oficializadas as escolas de habilitação de professores de posto que funcionavam em — Andulo, Luso, São Salvador, Cuíma, Malanje, Huíla, Vouga e Bela Vista.

No dia 31 de Dezembro de 1969, foi dado patrono a mais uma escola de habilitação de professores de posto, a de Santa Comba, nessa data criada. E em 25 de Agosto de 1970 era fundada outra, em Belise, à qual foi logo dado titular. Estes estabelecimentos receberam os nomes de:

Cabral Carmona;
—Eurico Ferreira Gonçalves.

No dia 29 de Abril de 1969, foram criadas algumas escolas de artes e ofícios; pouco depois, em 26 de Agosto e 10 de Outubro, eram-lhes atribuídos os seguintes patronos:

—Honório Barreto;
—Santos Prado;
—Américo Mendóça Frazão;
—António Fernandes Júnior;
—Maria Helena Tiroa;
—Leandro de Mendonça;
—Bicudo da Costa;
—Celso Vila Nova;
—Carlos Santos;
—Carloto de Castro.

No dia 3 de Abril de 1969, o governador-geral Camilo Augusto de Miranda Rebocho Vaz atribuiu à Escola de Artes e Ofícios de Pereira de Eça o nome do titular da Secretaria Provincial de Educação, Dr. José Pinheiro da Silva.

Escreveu-se na respectiva portaria que tal patrono deveria ser pessoa ilustre que, pelas suas invulgares qualidades de carácter e outras raras virtudes, possa ser apontada às novas gerações como exemplo digno de ser seguido. Segundo se esclarecia, fizera tal proposta a Direcção Provincial dos Serviços de Educação, respeitando-se portanto o que fora estabelecida pela portaria de 9 de Abril de 1966, que atrás transcrevemos.

Em diversos diplomas publicados em fins de 1969, ao longo de todo o ano de 1970, e alguns até já no decurso de 1971 e de 1972, foram atribuídos novos patronos a muitas escolas de diversas denominações e alguns a Lares de Estudantes que foram sendo estabelecidos em várias cidades. Amalgamando as informações dispersas, pudemos reunir numa lista única os nomes das individualidades seguintes:

—D. Manuel Nunes Gabriel;
—Fernando Torres Vieira Dias;
—Joaquim Cordeiro da Mata;
—Justino Mendes de Almeida;
—Fernando Pimentel Júnior;
—Narciso do Espírito Santo;
—António Correia de Freitas;
—Monsenhor Alves da Cunha;
—José Maria de Miranda Henriques;
—Carvalho Azevedo;
—Oliveira Santos;
—D. Luís Filipe;
—Filomeno da Câmara;
—João de Almeida;
—D. Carlos I;
—Pereira de Matos;
—Irene Bettencourt Medeiros Portela;
—Francisco de Sousa Coutinho;
—Silvino Silvério Marques;
—Dr. José Carlos Ferreira de Almeida;
—Dr. Carlos Joaquim Tavares;
—Coronel Franco do Carmo;
—General Geraldo António Vítor;
—João Rodrigues Leitão;
—José Manuel C. Baptista Franque;
—Alferes Mota da Costa;
—Dr. Carneiro Pacheco;
—Dr. António Sardinha;
—D. Eduardo André Muaca;
—João de Deus;
—Barão de Água-Izé;
—Marcelo Caetano;
—Dr. António de Oliveira Salazar;
—Coronel Rebocho Vaz;
—Calouste Gulbenkian;
—Azeredo Perdigão;
—Américo Tomás;
—Rui Molar;
—P. José Maria Antunes;
—Eugénio Tavares;
—Ernesto de Melo;
—José Pedro Lemos Moreira;
—Ernesto de Vilhena;
—Joaquim Teixeira Moutinho;
—Dr. Silva Tavares;
—Tenente-coronel Domingos André;
—António José de Almeida;
—Álvaro Rodrigues da Silva Tavares;
—Álvares de Almada;
—Dr. Veiga de Macedo;
—António Veríssimo de Sousa;
—Rainha Santa Isabel;
—Rainha D. Leonor;
—Rebocho Vaz;
—Nossa Senhora da Muxima;
—Nossa Senhora das Graças;
—Nossa Senhora do Pópulo;
—Nossa Senhora da Paz;
—Nossa Senhora de Fátima;
—Imaculada Conceição.

Faremos aqui uma pausa para mencionar algumas particularidades, em relação a alguns nomes. Não nos alargaremos muito, para não dilatar exageradamente estas notas.

Narciso do Espírito Santo era de ascendência indígena, como diversos outros patronos mencionados. A portaria dizia dele ter sido jornalista que a par das suas excepcionais qualidades de carácter é considerado um dos maiores, se não o maior jornalista africano português de todos os tempos.

António Correia de Freitas foi também jornalista e mestre de jornalistas, a par da nobreza e verticalidade de carácter que sempre demonstrou ao longo de toda uma vida de intenso e profícuo labor, situou a sua acção, em todas as circunstâncias, na defesa intransigente da nossa presença nestas terras. Esta linguagem não pode aceitar-se ao pé da letra; Correia de Freitas defendeu sempre os interesses de Angola, mas combateu muitas vezes as posições estatais; era considerado opositor ao regime vigente; quanto à permanência de Portugal, não lhe era possível tomar posição contrária; o seu jornal, A Província de Angola, mais do que a presença defendia a continuidade cultural.

D. Eduardo André Muaca foi bispo coadjutor e depois arcebispo de Luanda e era, tal como Narciso do Espírito Santo, indígena de Angola de etnia africana.

Eram nativos da região de Cabinda dois dos patronos nomeados, mesmo da aristocracia da terra, D. José Manuel da Conceição Baptista Franque e João Rodrigues Leitão; se o primeiro recebia o prenome de "Dom", o segundo usava até o título honorífico de "Visconde de Cacongo e Massabi", que lhe fora atribuído pelo monarca português.

Contam-se também como indígenas de Angola o filantropo Fernando Torres Vieira Dias, o escritor e quimbundista Joaquim Cordeiro da Mata. Era também angolano, não sabemos se branco, mestiço ou preto, o professor do ensino superior Carlos Joaquim Tavares.

Ao recolher os dados aqui inseridos, verificámos a repetição de nomes de patronos e até a atribuição de dois titulares ao mesmo estabelecimento; no primeiro caso houve intenção deliberada, mas no segundo apenas aconteceu isso por lapso e defeitos do funcionamento dos serviços burocráticos.

Aconteceu até que ao pretender dar o nome de D. Francisco Inocêncio de Sousa Coutinho, celebérrimo governador-geral de Angola e notável filantropo, a uma escola angolana foi mencionado o nome de Francisco Pereira Coutinho, distinta figura portuguesa mas ligado à História do Brasil que não à de Angola.

A maior parte das individualidades têm registo no livro editado em Luanda nos fins de 1970, Patronos das Escolas de Angola. Em princípio abrange todos os que tinham sido concedidos antes da sua impressão, exceptuando aqueles que, por motivos muito variados, tinham sido excluídos, pela revogação de anteriores decisões.

As informações deste capítulo apenas pretendem dar elementos históricos, cujo valor pode ser discutido. Muito da grande história faz-se e deve ser feito com a pequena história. Não sabemos ao certo como se fará a evolução; os vindouros não nos pedirão licença para pensar e agir, como nós a não pedimos aos que nos precederam. Nem sempre pactuarão com as nossas ideias, com a nossa mentalidade; mas quantos mais dados tiverem para analisar, mais perfeita será a sua apreciação.



 
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