As novas conquistas da saúde do trabalhadorAssolado pelo fantasma do desemprego, o trabalhador brasileiro procura, a qualquer custo, a manutenção do emprego. Pressionado por essa situação, tem ainda que conviver com ameaças diárias à saúde, como o estresse, as Lesões por Esforços Repetitivos (LER) ou Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (Dort), problemas cardíacos e gástricos, ocasionados ou agravados pelo trabalho. A maioria dos trabalhadores não conta com planos de saúde que cubram seu tratamentos e o de sua família, e depende do Sistema Único de Saúde (SUS). Embora a Constituição assegure o direito à saúde, apenas recentemente começaram a vislumbrar medidas de apoio à saúde do trabalhador. A Secretaria de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde tem demonstrado preocupação com a saúde dos trabalhadores, por meio da implementação de importantes medidas, dotando de esperança uma grande massa de pessoas que lutam por saúde de qualidade. Entre as ações, o ministério elaborou a Norma Operacional de Saúde do Trabalhador (Nost) para direcionar a atuação de Estados e municípios. A publicação trouxe relevantes orientações de como os governos locais devem proceder na implantação de ações e serviços de atenção à saúde do trabalhador, no âmbito do SUS. A principal característica dessa norma é que ela considera a distinção de gênero, contemplando as diferenças entre homens e mulheres no universo do trabalho. A Nost estabelece que os municípios são responsáveis pela garantia de atendimento às vítimas de acidentes em serviço e aos portadores de doença ocupacional. É também o município quem deve fiscalizar ambientes de trabalho para a identificação de situações de risco, sendo seu dever notificar casos e oferecer suporte técnico especializado para o estabelecimento da relação do trabalho com a doença, o diagnóstico, o tratamento, a recuperação e reabilitação da saúde, mantendo, ainda, unidade especializada de referência em saúde do trabalhador. Saindo do papel, essas atribuições representam avanços na relação do governo com o trabalhador. Outro exemplo é o Protocolo de Investigação, Diagnóstico, Tratamento e Prevenção de LER/ Dort, cujo texto está aprovado. A versão gráfica está em preparação, mas já a partir do mês deste mês, o Protocolo estará disponível na home page do Ministério da Saúde, no site da Saúde do Trabalhador, e poderá ser solicitado à Cosat, Coordenadoria de Saúde do Trabalhador, para encaminhamento via correio eletrônico. O documento faz um alerta para a dimensão do problema -considerado epidêmico-, detalha o que são as LER/ Dort, enumera como são detectadas, determina os procedimentos para a identificação de casos e relaciona as etapas de tratamento. Trata-se de um manual para a rede de saúde, com o objetivo de padronizar o entendimento e suprir a ausência de informações sobre o assunto. Outras ações evidenciam a preocupação por parte do ministro José Serra com a saúde dos trabalhadores. Recentemente foi publicada uma portaria sobre Vigilância em Saúde do Trabalhador, que esclareceu dúvidas sobre a atuação do SUS na vigilância em ambientes de trabalho. Especificamente sobre as LER/ Dort, o ministério desenvolveu, além do protocolo, o projeto "Rede de Cuidados Integrais em LER/ Dort", realizado em 50 municípios de cinco Estados (SP, MG, RS, BA, RJ), conjuntamente pelo Ministério da Saúde e secretarias estaduais da Saúde, visando organizar uma rede de referência dentro do SUS para prevenção, diagnóstico e tratamento das Lesões por Esforços Repetitivos. A efetiva implementação dos projetos contribuirá significativamente para ampliar as ações de prevenção, além de qualificar os atos de diagnóstico, tratamento e reabilitação. A continuidade das iniciativas do Ministério da Saúde é essencial para que se consiga reverter a tendência epidêmica que vem acometendo milhares de trabalhadores, dos mais diversificados setores. O Brasil está em busca de um modelo satisfatório de atendimento à saúde do trabalhador. A regulamentação, se por um lado alcança níveis satisfatórios, por outro ainda enfrenta problemas na implementação, como a morosidade, além de fiscalização precária. Há vários entraves na execução de ações, de acordo com o próprio Ministério da Saúde: ausência de recursos e meios na rede para diagnóstico e tratamento de ocorrências relacionadas ao trabalho, falhas nos registros de casos, que impedem o devido acompanhamento, pouca vigilância em ambientes de trabalho, não capacitação de profissionais e mais as dificuldades financeiras e a falta de condições materiais do SUS. A assistência à saúde do trabalhador exige do Estado investimentos crescentes e deve merecer prioridade nas ações. É fundamental que haja maior informação aos trabalhadores e profissionais de saúde a respeito dos problemas ocupacionais, para possibilitar a prevenção dos mesmos. É preciso intensificar a vigilância em saúde do trabalhador, buscando maior intervenção para promover o cumprimento das normas, monitoramento dos casos, melhoria dos ambientes de trabalho e a redução dos riscos de doenças e de acidentes de trabalho. Há muito o que construir na área de saúde do trabalhador, mas esse caminho já não está tão árido. Há algumas realizações de alta relevância e que devem ser estimuladas. O trabalhador brasileiro têm direito a uma qualidade de vida digna e isso só será possível com um sistema de saúde que o trate com dignidade. As medidas da Secretaria de Políticas de Saúde representam o início, que deverá sedimentar uma gama de realizações mais extensas e profícuas. (Folha de S. Paulo, 02/04/2000) |